Trechos de:“ João Bénard da Costa: Outros Amarão as Coisas Que Eu Amei( 2014) de Manuel Mozos”, por João Lameira. Íntegra: http:// www. apaladewalsh. com / 2015 / 10 / joao-benard-da-costa-outros-amarao-ascoisas-que-eu-amei-2014-de-manuel-mozos /“ Fundamental é a vida. A vida continua sempre. É de vida que fala este filme de morte.” Estas palavras, ditas pela boca de João Bénard da Costa a respeito de um outro filme [ julgo que Ta ‟ m e guilass( O Sabor da Cereja, 1997) de Abbas Kiarostami ], encerram o documentário de Manuel Mozos. O realizador usa-as para descrever( descobrir, descerrar) a sua obra. João Bénard da Costa: Outros Amarão As Coisas Que Eu Amei( 2014) é menos uma biografia de uma figura importante do que o luto pela morte de uma pessoa amada. Mais precisamente, é a( tentativa de) ressurreição do seu espírito. Um milagre do cinema, a vida para além da vida.
[...] Desta forma, Outros Amarão As Coisas Que Eu Amei fecha-se aos nãobénardianos. Recusando ser um documentário biográfico convencional, com cabeças falantes e / ou narração explicativa, como que toma o lugar do fantasma de Bénard da Costa, visitando( assombrando) os locais por onde este passou, os objectos em que pegou, as pinturas que olhou, os filmes que inventava de memória, levando o espectador fiel consigo. No entanto, pondo as coisas de outra maneira, abre-se ao mistério, à fé tão cara a Bénard. Mozos traça o caminho que o espectador neófito mas interessado poderá descobrir, se nele quiser penetrar, como as crianças medrosas se perdiam nas densas florestas dos contos infantis. Para que( est) a vida continue, é preciso obscurecê-la. Demasiada claridade mataria o desejo de conhecê-la. Sombra e luz. Luz e sombra. Como no cinema.
[...] Segundo Mozos, a obsessão de Bénard pela morte, a ressurreição, os fantasmas surge já nos escritos pueris de juventude( aos quais teve acesso), tornando-se óbvia para todos mais tarde. O realizador“ aproveita-se” tão-só dela para estruturar o seu“ filme de morte”. Outros Amarão As Coisas Que Eu Amei volta e retorna a sequências de três filmes essenciais para entendêla: Portrait of Jennie( O Retrato de Jennie, 1948) de William Dieterle, no qual uma aparição viaja no tempo para perturbar a vida( e obra) de um pintor; Ordet( A Palavra, 1955) de Carl Th. Dreyer, em que a força da fé tem o poder de ressuscitar os mortos. E The Ghost and Mrs. Muir( O Fantasma Apaixonado, 1947) de Joseph L. Mankiewicz, cuja protagonista se entrega a um falecido marinheiro, na vida e para além desta. No final desse filme, no final deste filme, uma porta fechase sobre a neblina do além-mundo, para onde Mrs. Muir e o fantasma apaixonado caminham de mãos dadas. O documentário segue atrás deles, quando a bobine acaba.