A crise não parece ter fim PD48 | Page 72

sentido, é necessária a criação de regras rigorosas destinadas à democratização interna desses partidos que hoje, não raro, são dominados por camarilhas que privatizam a ação partidária e se perpetuam no domínio de siglas, reproduzem carreiras políticas inclusive com crescente caráter hereditário e reduzem os partidos a meras legendas eleitorais sem maiores vínculos com o conheci- mento da realidade do país e as reivindicações da população. Essa democratização interna dos partidos é essencial para que uma outra mudança basilar não se transforme em tiro pela cula- tra: como é vital para o parlamentarismo o voto preferencial do eleitor na instituição partido político e n o programa que ele apre- senta para a sociedade, a lista fechada de candidatos que dá suporte a esse mecanismo não poderá estar sujeita ao arbítrio daquelas camarilhas das quais falamos anteriormente, sob pena de retirar do parlamentarismo toda a sua autenticidade. Sem dúvida é fundamental que o eleitor, ao votar no partido sobretudo em função do seu programa, tenha certeza de que aquilo que vem dentro da embalagem realmente corresponde ao que dispõe o seu rótulo. Em outras palavras, que ao optar pelo programa A e não pelo C ou D, elegerá parlamentares de fato comprometidos antes de mais nada com esse programa e não com o fisiologismo de partido. Uma outra mudança primordial será, com o advento do parla- mentarismo, o fim da prática dos cargos comissionados, medida imprescindível para evitar a intromissão política na condução técnico-administrativa das máquinas públicas e a adoção plena da meritocracia no dia a dia dessa administração, reconduzindo o parlamento para suas funções primordiais quais sejam a defini- ção das políticas públicas, a construção dos consensos nacionais, regionais ou locais no processo de funcionamento da sociedade e da economia e a fiscalização eficaz dos negócios públicos e dos poderes da República. No nevoeiro causado pela conjugação da crise política com a crise ética e a crise econômica que faz o país agonizar durante um longo período de indefinições que se prestam a todos os pescadores em águas turvas, a ausência das soluções práticas que o parla- mentarismo poderia apresentar causa um outro dano ao Brasil: questões e desafios estruturais que seriam necessários para quali- ficar o país na travessia do século XXI, ficam adiadas em seu debate e enfrentamento para horizontes difíceis de enxergar. Ocorre que a natureza desses desafios, muitos deles planetários, é tão ameaçadora que não há mais tempo para continuar ignorando-os. 70 Anivaldo Miranda