sentido, é necessária a criação de regras rigorosas destinadas à
democratização interna desses partidos que hoje, não raro, são
dominados por camarilhas que privatizam a ação partidária e se
perpetuam no domínio de siglas, reproduzem carreiras políticas
inclusive com crescente caráter hereditário e reduzem os partidos
a meras legendas eleitorais sem maiores vínculos com o conheci-
mento da realidade do país e as reivindicações da população.
Essa democratização interna dos partidos é essencial para que
uma outra mudança basilar não se transforme em tiro pela cula-
tra: como é vital para o parlamentarismo o voto preferencial do
eleitor na instituição partido político e n o programa que ele apre-
senta para a sociedade, a lista fechada de candidatos que dá
suporte a esse mecanismo não poderá estar sujeita ao arbítrio
daquelas camarilhas das quais falamos anteriormente, sob pena
de retirar do parlamentarismo toda a sua autenticidade. Sem
dúvida é fundamental que o eleitor, ao votar no partido sobretudo
em função do seu programa, tenha certeza de que aquilo que vem
dentro da embalagem realmente corresponde ao que dispõe o seu
rótulo. Em outras palavras, que ao optar pelo programa A e não
pelo C ou D, elegerá parlamentares de fato comprometidos antes de
mais nada com esse programa e não com o fisiologismo de partido.
Uma outra mudança primordial será, com o advento do parla-
mentarismo, o fim da prática dos cargos comissionados, medida
imprescindível para evitar a intromissão política na condução
técnico-administrativa das máquinas públicas e a adoção plena
da meritocracia no dia a dia dessa administração, reconduzindo o
parlamento para suas funções primordiais quais sejam a defini-
ção das políticas públicas, a construção dos consensos nacionais,
regionais ou locais no processo de funcionamento da sociedade e
da economia e a fiscalização eficaz dos negócios públicos e dos
poderes da República.
No nevoeiro causado pela conjugação da crise política com a
crise ética e a crise econômica que faz o país agonizar durante um
longo período de indefinições que se prestam a todos os pescadores
em águas turvas, a ausência das soluções práticas que o parla-
mentarismo poderia apresentar causa um outro dano ao Brasil:
questões e desafios estruturais que seriam necessários para quali-
ficar o país na travessia do século XXI, ficam adiadas em seu
debate e enfrentamento para horizontes difíceis de enxergar. Ocorre
que a natureza desses desafios, muitos deles planetários, é tão
ameaçadora que não há mais tempo para continuar ignorando-os.
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Anivaldo Miranda