A Capitolina 6, junho 2014 | Page 12

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primeira publicação para este tipo de público, Monteiro Lobato remodelou a história original de Narizinho e reuniu algumas outras que havia escrito até então. Com isso, romancistas e críticos compartilharam a evolução da literatura infantil brasileira, embora de modo diferenciado: alguns recorreram ao folclore e às histórias populares:

O crescimento quantitativo da produção para crianças e a atração que ela começa a exercer sobre escritores compro metidos com a renovação da arte nacional demonstram que o mercado estava sendo favorável aos livros. Essa situação rela ciona-se aos fatores sociais: a consolidação da classe média, em decorrência do avanço da industrialização e da moder nização econômica e adminis trativa do país, o aumento da escolarização dos grupos urbanos e a nova posição da literatura e da arte após a revolução modernista. Há maior

número de consumidores, acele rando a oferta; e há a resposta das novas editoras, motivando a revelação de novos nomes e títulos para esse público desinteressado. (Lajolo & Zilberman 1998: 47)

Assim, pode-se dizer que foi nesse período que o mercado editorial, sobretudo o mercado

voltado para o público infanto-juvenil, começou a se concretizar. Monteiro Lobato foi, portanto, um autor que muito contribuiu para este marco na literatura infanto-juvenil.

O ano seguinte ao lançamento de Narizinho Arrebitado prome tia ser festivo, pois era a época de comemoração do centenário da independência política. Mas o ano de 1922 acabou sendo marcante por outros fatores. O primeiro foi a realização da Semana de Arte Moderna, em São Paulo, durante o mês de fevereiro. O segundo, ocorrido no Rio de Janeiro, foi o motim de Copacabana, reunindo os militares revoltados com o rumo conservador da política brasileira. O terceiro movimento renovador ocorreu no campo da educação, onde pedagogos, infl uenciados pelo pensamento norte-americano, fundaram o movimento da Escola Nova.

Opondo-se a um ensino destinado à elite, visavam à escolarização de toda a popu lação. As reformas ocorreram, mas nenhuma conseguiu estabelecer um sistema de ensino eficaz:

os livros para crianças foram profunda e sinceramente nacio nalistas, a ponto de elaborarem uma história cheia de heróis e aventuras para o Brasil, seu principal protagonista. Da mesma maneira, eles se lançaram ao recolhimento do folclore e das tradições orais do povo, com interesse similar as das escolas de samba, ao pesquisar os enredos para os desfi les. Porém, visando contar

com o aval público adulto, a literatura infantil foi preferen cialmente educativa e bem comportada, podendo transitar com facilidade na sala de aula ou, fora dela, substituí-la. (Lajolo & Zilberman 1998: 54).

Desde seu primeiro livro para crianças, Monteiro Lobato, paradigma da literatura infantil

brasileira, buscou inserir em suas obras elementos educativos. O sítio do Pica-pau amarelo representa mais do que uma simples história ingênua e rural. O sítio não é apenas o cenário onde a ação pode ocorrer, mas representa uma concepção a respeito do mundo e da sociedade, bem como uma tomada de posição a respeito da criação de obras para a infância.

As terras de Dona Benta desempenham função de uma escola, sendo a proprietária a professora ideal e os alunos, os moradores do sítio:

O sítio metamorfoseia-se numa escola paralela, reforçando a aversão do escritor pela instituição tradicional de ensino, cujas disposições física e psicológica o degradavam. Trata de substituí-las dando-lhe arranjo diferente, ao mesmo tempo antigo e moderno. Antigo, porque o modelo é a escola grega (...): um sistema de ensino que evoluiu através do diálogo, sem conclusões pré-fabricadas ou conclusões previstas por antecipação. Além disso, não supõe um espaço predeterminado, fixo de antemão e classifi cado como sala de aula. O espaço dessa escola lobateana muda segundo as conveniências, podendo ser tanto a sala principal da sede do sítio (...), ou a paisagem. (Lajolo & Zilberman 1998: 76).

Percebe-se, portanto, que Mon teiro Lobato tinha a preocupa preocupação de relacionar a literatura

infanto-juvenil com a educação, tentando conciliar tradição e inovação, tendo em mente,

porém, produzir histórias que fossem além dos limites das paredes de uma sala de aula.

O aproveitamento da tradição popular, de transmissão originalmente oral e vinculada

às populações dependentes da economia agrícola, sempre foi uma constante da literatura

infantil desde seu aparecimento na Europa, nos séculos XVIII e XIX. No Brasil, não aconteceu

essa apropriação direta do material, e sim o recurso ao acervo europeu, quando este já

tinha assumido a condição de literatura para crianças.

Com a disseminação do Modernismo, para o qual uma das fontes inspiradoras era o

folclore, as chances de que esse tema fosse aproveitado aumentaram. Mesmo com a incorporação

do acervo lendário e popular à literatura infantil, porém, nada impediu a adaptação

de obras estrangeiras. Isto é, as obras vindas do exterior, com suas diferentes culturas, ainda

eram consumidas pelo público infanto-juvenil. No setor da tradução, vários trabalhos de

qualidade apareceram entre os séculos XIX e XX, orientados por professores e escritor

brasileiros. Deve-se destacar a atuação de Carlos Jansen, que traduziu para o português muitas

obras estrangeiras, como As viagens de Gulliver.

É preciso lembrar um importante fator para a proliferação das traduções de obras

infanto-juvenis: a formação da infância brasileira após a década de 30, período em que se

tornou obrigatória a freqüência à escola. Até então, persistia a infl uência das amas-de-leite,

escravas e ex-escravas, a quem cabia, entre outras tarefas, transmitir o ensino sobre, principalmente,

a pátria.

O nacionalismo foi uma bandeira do Modernismo, mas, na literatura para crianças,

repercutiu de maneira tradicionalista. Verifi ca-se a presença de uma visão cívica da pátria,

fazendo das histórias pretexto para a valorização de símbolos, heróis ou episódios nacionais.

Monteiro Lobato foi marcante neste período da literatura infanto-juvenil, pois, em suas

obras, o espaço físico e a natureza são tão importantes quanto as personagens humanas das

histórias.

Atualmente, o que se vê é uma diversidade de temas que enriquecem o mercado

livreiro infanto-juvenil. Isso, porém, não garante seu pleno sucesso, visto que o livro sofre