11 A Capitolina
primeira publicação para este tipo de público, Monteiro Lobato remodelou a história original de Narizinho e reuniu algumas outras que havia escrito até então. Com isso, romancistas e críticos compartilharam a evolução da literatura infantil brasileira, embora de modo diferenciado: alguns recorreram ao folclore e às histórias populares:
O crescimento quantitativo da produção para crianças e a atração que ela começa a exercer sobre escritores compro metidos com a renovação da arte nacional demonstram que o mercado estava sendo favorável aos livros. Essa situação rela ciona-se aos fatores sociais: a consolidação da classe média, em decorrência do avanço da industrialização e da moder nização econômica e adminis trativa do país, o aumento da escolarização dos grupos urbanos e a nova posição da literatura e da arte após a revolução modernista. Há maior
número de consumidores, acele rando a oferta; e há a resposta das novas editoras, motivando a revelação de novos nomes e títulos para esse público desinteressado. (Lajolo & Zilberman 1998: 47)
Assim, pode-se dizer que foi nesse período que o mercado editorial, sobretudo o mercado
voltado para o público infanto-juvenil, começou a se concretizar. Monteiro Lobato foi, portanto, um autor que muito contribuiu para este marco na literatura infanto-juvenil.
O ano seguinte ao lançamento de Narizinho Arrebitado prome tia ser festivo, pois era a época de comemoração do centenário da independência política. Mas o ano de 1922 acabou sendo marcante por outros fatores. O primeiro foi a realização da Semana de Arte Moderna, em São Paulo, durante o mês de fevereiro. O segundo, ocorrido no Rio de Janeiro, foi o motim de Copacabana, reunindo os militares revoltados com o rumo conservador da política brasileira. O terceiro movimento renovador ocorreu no campo da educação, onde pedagogos, infl uenciados pelo pensamento norte-americano, fundaram o movimento da Escola Nova.
Opondo-se a um ensino destinado à elite, visavam à escolarização de toda a popu lação. As reformas ocorreram, mas nenhuma conseguiu estabelecer um sistema de ensino eficaz:
os livros para crianças foram profunda e sinceramente nacio nalistas, a ponto de elaborarem uma história cheia de heróis e aventuras para o Brasil, seu principal protagonista. Da mesma maneira, eles se lançaram ao recolhimento do folclore e das tradições orais do povo, com interesse similar as das escolas de samba, ao pesquisar os enredos para os desfi les. Porém, visando contar
com o aval público adulto, a literatura infantil foi preferen cialmente educativa e bem comportada, podendo transitar com facilidade na sala de aula ou, fora dela, substituí-la. (Lajolo & Zilberman 1998: 54).
Desde seu primeiro livro para crianças, Monteiro Lobato, paradigma da literatura infantil
brasileira, buscou inserir em suas obras elementos educativos. O sítio do Pica-pau amarelo representa mais do que uma simples história ingênua e rural. O sítio não é apenas o cenário onde a ação pode ocorrer, mas representa uma concepção a respeito do mundo e da sociedade, bem como uma tomada de posição a respeito da criação de obras para a infância.
As terras de Dona Benta desempenham função de uma escola, sendo a proprietária a professora ideal e os alunos, os moradores do sítio:
O sítio metamorfoseia-se numa escola paralela, reforçando a aversão do escritor pela instituição tradicional de ensino, cujas disposições física e psicológica o degradavam. Trata de substituí-las dando-lhe arranjo diferente, ao mesmo tempo antigo e moderno. Antigo, porque o modelo é a escola grega (...): um sistema de ensino que evoluiu através do diálogo, sem conclusões pré-fabricadas ou conclusões previstas por antecipação. Além disso, não supõe um espaço predeterminado, fixo de antemão e classifi cado como sala de aula. O espaço dessa escola lobateana muda segundo as conveniências, podendo ser tanto a sala principal da sede do sítio (...), ou a paisagem. (Lajolo & Zilberman 1998: 76).
Percebe-se, portanto, que Mon teiro Lobato tinha a preocupa preocupação de relacionar a literatura
infanto-juvenil com a educação, tentando conciliar tradição e inovação, tendo em mente,
porém, produzir histórias que fossem além dos limites das paredes de uma sala de aula.
O aproveitamento da tradição popular, de transmissão originalmente oral e vinculada
às populações dependentes da economia agrícola, sempre foi uma constante da literatura
infantil desde seu aparecimento na Europa, nos séculos XVIII e XIX. No Brasil, não aconteceu
essa apropriação direta do material, e sim o recurso ao acervo europeu, quando este já
tinha assumido a condição de literatura para crianças.
Com a disseminação do Modernismo, para o qual uma das fontes inspiradoras era o
folclore, as chances de que esse tema fosse aproveitado aumentaram. Mesmo com a incorporação
do acervo lendário e popular à literatura infantil, porém, nada impediu a adaptação
de obras estrangeiras. Isto é, as obras vindas do exterior, com suas diferentes culturas, ainda
eram consumidas pelo público infanto-juvenil. No setor da tradução, vários trabalhos de
qualidade apareceram entre os séculos XIX e XX, orientados por professores e escritor
brasileiros. Deve-se destacar a atuação de Carlos Jansen, que traduziu para o português muitas
obras estrangeiras, como As viagens de Gulliver.
É preciso lembrar um importante fator para a proliferação das traduções de obras
infanto-juvenis: a formação da infância brasileira após a década de 30, período em que se
tornou obrigatória a freqüência à escola. Até então, persistia a infl uência das amas-de-leite,
escravas e ex-escravas, a quem cabia, entre outras tarefas, transmitir o ensino sobre, principalmente,
a pátria.
O nacionalismo foi uma bandeira do Modernismo, mas, na literatura para crianças,
repercutiu de maneira tradicionalista. Verifi ca-se a presença de uma visão cívica da pátria,
fazendo das histórias pretexto para a valorização de símbolos, heróis ou episódios nacionais.
Monteiro Lobato foi marcante neste período da literatura infanto-juvenil, pois, em suas
obras, o espaço físico e a natureza são tão importantes quanto as personagens humanas das
histórias.
Atualmente, o que se vê é uma diversidade de temas que enriquecem o mercado
livreiro infanto-juvenil. Isso, porém, não garante seu pleno sucesso, visto que o livro sofre