1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 99
A PEDAGOGIA DO PASSADO COMO
CONSTRUÇÃO DO FUTURO
Marco Aurélio Nogueira1
O
golpe de 1964 é história. Pode e deve ser analisado com
frieza e objetividade. O texto que se segue pretende fazer
uma reflexão livre sobre o peso e o valor do passado em
nossas vidas. Quanto o futuro deve ao passado? Ele, o passado,
determina nossos passos no presente? Somos dependentes dele?
Uma relação reflexiva com o passado pode ser tomada como
essencial. Antes de tudo, por seu valor pedagógico: aprendemos
com ela. Como coletividade e como seres políticos, devemos assimilar, por exemplo, o que o golpe de 64 significou, porque ocorreu, que
apoios e desdobramentos teve, que impacto produziu na sociedade.
Na medida em que fizermos isso, melhoraremos a compreensão do
país em que vivemos, entenderemos melhor o significado da democracia e processaremos criticamente o próprio passado, reforçando
nossa capacidade de evitar novos golpes e impedir a circulação dos
efeitos tóxicos e perversos de toda e qualquer ditadura.
O passado a rigor nunca passa. Ele se cola à experiência
histórica dos povos como uma segunda pele. Somos o que somos
porque fomos. Verdade conhecida por historiadores e cientistas
sociais, a frase parece assumir proporções trágicas no Brasil, que
carrega em seu DNA a dificuldade de romper com os arranjos
sociopolíticos que, vindos do passado e acumulados pelo tempo,
terminam por frear ou moderar o progresso social. Entre nós,
1
Cientista político, professor titular de Teoria Política e diretor do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais da Unesp, autor, dentre outros, de As ruas e a
democracia – Ensaios sobre o Brasil contemporâneo, Fundação Astrojildo Pereira/
Contraponto, 2013.
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