1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 213
AS DIVISÕES INTERNAS
Severino Theodoro de Mello1
E
u estava em uma posição até certo ponto privilegiada para
entender o que se passava com o PCB no início do Golpe.
Na avaliação preliminar da direção do Partido, Executiva e
Secretariado, o Golpe duraria dois ou três anos. Os próprios militares alegaram que fariam uma reforma na Constituição e que depois
a situação se normalizaria, digamos. O marechal Castelo Branco
defendia isso. E eu não tenho dúvida de que seria assim se o pessoal
da luta armada não tivesse tomado o caminho que tomou.
Uma coisa é certa: a extrema-direita enlouquecida não teria
condições de arrastar a massa de oficiais do Exército a apoiar aquela
política repressiva – como, de fato, essa massa terminou apoiando
– sem que uma parcela da esquerda fornecesse o pretexto. Só quem
passou pelo Exército pode se inteirar de como funciona a cabeça do
militar. Eu alertava os companheiros do Partido para esse fato.
Acontece que o militar é preparado para a guerra. No tempo em que
eu vivi em quartel, ninguém falava ainda em guerra interna, concepção que foi surgindo depois. O soldado era preparado, então, para a
guerra e nesta não existe crime. Você mata o inimigo e não é considerado assassino. Isso vem da própria prática da guerra e depois se
transformou em uma convenção internacional.
Quando os alemães criaram o conceito de guerra contra o
chamado inimigo interno – acredito que ainda no século XIX, nos
embates contra os socialistas, o que se exacerbou no período
1
Dirigente histórico do PCB, foi um dos partícipes da Intentona Comunista de 1935,
no Recife.
211