1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 194

É assim que, em fins dos anos de 1970, o argumento democrático se desvencilha da sua subordinação à questão nacional, estabelecendo-se a conquista das liberdades democráticas como foco central da luta comunista. Em maio de 1978, se consagra a via eleitoral como “forma superior de luta” e, em novembro daquele mesmo ano, uma nova resolução política do Comitê Central sustentava que, para os comunistas, “a luta pela democracia é parte integrante da luta pelo socialismo”, sendo a frente antifascista indiferente aos interesses econômicos das forças que a compunham. Nas palavras de Werneck Vianna, “estava completada a arquitetura da estratégia democrática, emancipando o PCB da hipoteca terceiro-mundista”.10 Muitos fatores colaboraram para a vitória da concepção de democracia progressiva, considerando-se que tal concepção não era inteiramente estranha à Declaração de 1958 e ao VI Congresso, em 1967. Mas, naquelas duas ocasiões persistira um viés terceiro-mundista, que conferia severos limites à nova identidade que a questão democrática fomentava entre a militância comunista. Seria preciso que a crítica ao “orientalismo político” atingisse um grau maior de elaboração e de explicitação de suas consequências no plano prático. Foi o que ocorreu ao final da década de 1970. Assim, um primeiro fator decisivo à plena assunção da estratégia democrática pelos pecebistas foi a construção de uma nova visada sobre o processo de implantação do capitalismo no Brasil, abandonando-se conceitos como feudalidade e a polaridade “moderno versus atraso” para afirmar a natureza prussiana da nossa formação social, resultado de uma modernização estatizante e repressiva em relação à força de trabalho, sustentada na coalizão entre elites empresariais e oligarquia agrária.11 Desse ponto de vista, era possível não apenas compreender os elementos de continuidade entre o pré e o pós-64, mas também redefinir o significado da democracia, entendendo-a como descontinuidade em relação à modernização prussiana, isto é, 10 WERNECK VIANNA, Luiz, 1989. 11 Idem, 1997. 192 1964 – As armas da política e a ilusão armada