1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 201
A Revolução de 30, concebida dentro desse espírito,
contrariou abertamente o pensamento liberal que até então
comandara a vida política brasileira. A ação coordenada, o
projeto nacional então concebido, moldou a sociedade brasileira de acordo com a filosofia positivista. O fortalecimento do
Estado, a centralização administrativa, a criação de indústrias
estatais, o planejamento econômico e, principalmente, a legislação social, eram vetores claros do projeto positivista e, naturalmente, produziram a ira dos liberais.
Estes nunca perdoaram a “intromissão” do Estado nas relações de trabalho. O liberalismo pressupunha a igualdade das partes
contratantes (o operário e o burguês). A questão social, restrita à
esfera privada, ao Código Civil, revelou-se um “caso de polícia”: as
greves, entendidas como “baderna”, eram reprimidas diretamente.
Após a Revolução de 1930, o Estado passou a intervir nos contratos
de trabalho, na fixação do salário mínimo, na fiscalização das fábricas, criou a Justiça do Trabalho (com representação operária), legalizou o direito de greve etc. Assim, o Estado reconheceu que as partes
contratantes não eram iguais como apregoava o formalismo jurídico
liberal. Consagrou-se, desse modo, a publicização do direito que
transformou a questão social numa “questão política”.
A concepção organicista do positivismo pregava a subordinação das partes ao todo. Daí o empenho em colocar obstáculos ao
“egoísmo” burguês com a criação de uma rede de proteção social
para os “humildes”. Mas, daí também nasceu o sindicalismo oficial:
pela primeira vez, a classe operária passou a ter uma organização de
massas em todo o território nacional – restrita, entretanto, ao meio
urbano (a exclusão do campo ajuda a explicar o surgimento das
Ligas Camponesas, no pré-64 e do MST, nos anos 80). A criação do
sindicalismo, entendido como “órgão de colaboração com o Estado”,
teve efeitos ambivalentes: nas épocas democráticas, essa relação
estreita com o Estado serviu tanto como instrumento de pressão
política para se obter reivindicações (por exemplo: o décimo-terceiro
salário) quanto para a criação de uma casta de parasitas (os pel Vv