1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 166
A surpreendente vitória eleitoral do Comando por el No, que
dizia “não” ao governo Pinochet, em outubro de 1988, abriu o
processo de transição à democracia. O resultado do plebiscito foi
de 56% dos votos válidos pelo “não” contra 44% pelo “sim”. Os
partidos políticos puderam se reorganizar e a oposição a Pinochet,
com exceção do Partido Comunista, criou a Concertación de los
Partidos por la Democracia, numa tentativa de manter-se unida
para a eleição presidencial prevista para o ano seguinte. Mas Pinochet, presidente da República e chefe das Forças Armadas, forçou
um pacto com a oposição em torno de reformas constitucionais.
Este pacto redundou em um referendo, realizado em julho de 1989,
para sancionar as reformas da Constituição de 1980 acordadas
entre os principais atores políticos legalizados. Nesse ponto, a
submissão da transição democrática à “política do autoritarismo”
ficou evidente (HUNEEUS, 2000). O referendo sancionou o que
ficou conhecido como enclaves autoritários: normas concebidas
para bloquear, sem transgredir a legalidade, qualquer iniciativa
reformista que se propusesse a desmontar a arquitetura básica do
ordenamento jurídico-constitucional do autoritarismo chileno.
A derrota eleitoral sofrida por Pinochet em 1988 converteu-se assim numa vitória política estratégica em 1989, uma vez que
se aprovaram apenas reformas superficiais na Constituição de
1980. A transição, contudo, seguiria em marcha. No início da
década de 1990, os espaços políticos se democratizaram e a disputa
se concentrou em dois polos: a Concertación, agregando os partidos de centro-esquerda – como o Partido Socialista e a DC – e a
Alianza por Chile, articulando as forças de direita e neoliberais –
como a Renovação Nacional (RN) e a União Democrática
Independente (UDI).
Em relação às outras transições para a democracia no continente latino-americano, especialmente a brasileira, o país andino
viveu dois aspectos peculiares: não herdou nenhuma crise econômica do regime anterior e conseguiu eleger sucessivamente quatro
presidentes pertencentes à Concertación – a mesma coalizão política que havia derrotado a ditadura. A partir de 1990, a pátria de
164
1964 – As armas da política e a ilusão armada