presidente Dilma Rousseff. Com efeito, durante seu curso – tudo
indica, encerrado – viveu-se aqui como que uma terra em transe,
com manifestações de rua e passeatas de empalidecer as france-
sas, aparentando prometer, como essa esquerda desejava, a hora
de ruptura catastrófica com nossas instituições.
Foi um tempo em que se coqueteava com o tema das revolu-
ções, cuja porta de entrada seria a derrubada do governo consti-
tucional de Michel Temer, com a imediata convocação de eleições
gerais, provavelmente com poderes constituintes e demais assun-
tos de igual calibre. A sucessão presidencial, confirmando o papel
taumatúrgico das eleições nas crises políticas brasileiras, no
entanto, nos devolveu ao Brasil real, dissolvendo no ar as fabula-
ções revolucionaristas. Mais uma vez, passamos a conviver com o
eterno retorno dos processos de transição, com o qual veio à luz
nosso Estado-nação – não conhecemos, como se sabe, ao contrário
da América hispânica, revoluções nacional-libertadoras. Mesmo
registro político, aliás, com que interrompemos o regime do auto-
ritarismo militar que nos dominou por duas décadas.
É ele, agora, apesar da pantomima ensaiada em torno da
candidatura Lula ao tentar ameaçar nossa democracia com a
cantilena contra o nosso sistema de Justiça, que se impõe atrás
desse teatro de sombras em que se ocultam alguns protagonistas.
Pois aquilo que se encoberta é o fato de já estarmos numa transi-
ção do longo ciclo da modernização autoritária de Vargas à Dilma,
para um novo tipo de relações entre o Estado e a sociedade,
centrada na participação social e no aprofundamento da demo-
cracia, tanto por processos que revolvem os fundamentos mate-
riais de nossas estruturas, em especial no mundo do trabalho e
da produção, quanto pelas mudanças ideais que se manifestam
em nossa capacidade de reflexão sobre nós mesmos.
Os debates presidenciais aclaram o ponto, mesmo que vindos
de narrativas toscas e rústicas, contrapondo candidatos que se
situam no campo favorável a essa transição aos contrários a ela,
na pretensão de darem continuidade ao processo de moderniza-
ção autoritária, jogando para baixo do tapete o fato de que ela foi
levada à exaustão no governo Dilma.
A força do tema se faz presente até mesmo em candidaturas
avessas a ele, ora em Jair Bolsonaro, que faz profissão de fé no
liberalismo econômico em oposição ao capitalismo de Estado, ora
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Luiz Werneck Vianna