Perfil
4patas
Por Karla Matida
Foto Fábio Pitrez
guia
Depois de um treinamento de cerca de dois anos, a golden retriever
Júlia se tornou o cão-guia de Gabriel Vicalvi. O Brasil, com 6,5
milhões de pessoas com baixa visão, tem apenas 80 animais aptos
A golden retriever Júlia é ainda mais especial do que
seus lindos e longos pelos dourados sugerem. Há
cerca de um ano ela acompanha o analista de s istemas
Gabriel Vicalvi pelas ruas de São Paulo. “Há um ano eu
não sei mais o que é ter galo na cabeça”, lembra.
Sempre bem-humorado, o analista de sistemas
também transforma risadas em lágrimas quando
compartilha suas histórias com a plateia formada
por funcionários e diretores de uma fábrica de
ração em Arapongas.
Deficiente visual desde o nascimento, Vicalvi conta
que sempre foi ousado. Não enxergar nunca foi motivo
para ele ficar em casa. E os galos eram consequências
de galhos de árvore e telefones públicos, obstáculos
aéreos dos quais a atenta Júlia agora o faz desviar.
“É nessas horas que a gente vê o quanto vale nosso
investimento”, explica José Marcos Calsavara, da
Brazilian Pet Foods, patrocinador do Instituto Cão-Guia
Brasil há cerca de dois anos e meio. “Outros três cães
serão entregues no ano que vem e já há outros em
outras fases de treinamento”, explica Calsavara.
Durante quase dois anos, a cachorra foi treinada no
Instituto Cão-Guia Brasil, no Rio de Janeiro. A seleção
dos animais acontece logo nos três primeiros meses
de vida. Com as características necessárias para ser
um guia, o cão vai para o treinamento, mas nem
todos terminam o processo. “Cerca de 30% apenas”,
contabiliza o treinador George Thomaz Harrison.
O longo treinamento, as dificuldades de encontrar
animais que sejam aptos e as questões financeiras
são alguns empecilhos na empreitada. Hoje o Brasil,
que tem 6,5 milhões de pessoas com baixa visão,
conta com apenas 80 cães-guia. Enquanto isso, cerca
de 12 mil pessoas esperam por um animal treinado
como Júlia.
Gabriel Vicalvi, estudante de análise de sistemas,
passou quase cinco anos na lista de espera por um
cão-guia. “Não é uma fila porque não é por ordem
de chegada”, explica. Cachorro e dono em potencial
precisam ser compatíveis. E após a seleção, a dupla
e mais o treinador ficam um mês em adaptação. “É o
tempo para tirar a carteira de motorista de cão-guia”,
brinca Vicalvi.
98 WINK mag
Com a ajuda de Júlia, Vicalvi veio sozinho de São Paulo
para o Paraná. “Com a Júlia, nunca mais fiquei sozinho”,
frisa. Por lei, o cão-guia vai na cabine com o dono e
não na parte de cargas, como os outros animais.
O Instituto Cão-Guia Brasil foi fundado em 2009,
por Harrison. “Já trabalhava com treinamento de
cachorros, mas depois de conhecer um cão-guia, me
apaixonei”, lembra. Com Júlia, o treinador soma seis
cães entregues. “No Brasil, contando com os outros
institutos, são cinco cães por ano”, diz.
De acordo com Harrison, o custo de um cão-guia varia
entre 35 a 45 mil reais, que é bancado pelo instituto, já que
o deficiente visual não paga nada. “Nos Estados Unidos, o
custo fica entre 50 e 60 mil dólares, na Europa, uns 30 mil
euros. Mas depende do tamanho dos institutos.”
O carinho e atenção de Júlia, são as características mais
fortes percebidas por Vicalvi. “Tenho muita confiança
nela, afinal, entreguei minha vida a ela”, afirma o
analista. Ah, sim, Júlia também está no Facebook (www.
facebook.com/juliacaoguia).