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{ leituras } O NOME NA PONTA DA LÍNGUA | PASCAL QUIGNARD | TRAD. YOLANDA VILELA; RUTH SILVIANO BRANDÃO | ED. CHÁO DA FEIRA | 2018
Pascal Quignard mescla ficção e filosofia para vasculhar a linguagem, a escrita, o pensamento, a leitura e a vida. A obra reúne dois textos do autor. O primeiro, " O nome na ponta da língua ", compõe-se de três partes. A mais ficcional não se apaga da memória facilmente: a história inicial de " A palavra na ponta da língua ", o lendário caso de Jeûne e Colbrune, como mito, profecia, alegoria, sonho, para pensar a“ palavra ", o " nome ". A leveza da narrativa contrasta com a densidade das reflexões de Quignard. O segundo texto do livro divide-se em duas partes. " O enigma " constitui narrativa dotada de magia mítica de alto teor filosófico e poético em torno da metalinguagem e até da tradução, sem contar as relações com a psicanálise. O tema da tradução continua em“ Comentário sobre três versos de Donne ". Quignard deixa, no leitor, um gosto de poesia na ponta da língua.
O PESO DO PÁSSARO MORTO { ROMANCE } | ALINE BEI | ED. NÓS | 2017
Uma mulher aos 8, 17, 18, 28, 37, 48, 49, 50 e 52 anos. A morte da amiga Carla na infância. A experiência marcante com o benzedeiro Luís. O estupro e a violência sexual sofridos de seu namorado Pedro quando tinha 17, o que resultou em uma gravidez indesejada. O filho, Lucas, nascido no ano seguinte. Um Lucas que jamais saberia de como havia sido gerado, nem do paradeiro do pai. Dez anos depois, Bete cuida de Lucas, mais do que a própria mãe. Ainda criança, o filho brincava de matar pássaros. Bete morre. Com 37, vê o filho partindo para Ouro Preto, para cursar História. Encontra um cachorro abandonado em uma loja de conveniência em um posto de gasolina. Vento passará a ser seu melhor companheiro. Aos 48, descobre-se avó. Um ano depois, a mudança do apartamento para uma casa. Lembranças da infância em velhos guardados lhe assaltam. Com 50, ainda mais só, troca a televisão por uma vitrola. Vento é atropelado e morto. Tudo isso é narrado em primeira pessoa, com exceção das últimas páginas no capítulo“ póstumo”. Narrativa com estilo próprio, organizada em espécie de versos( sem rimas), com vários espaços em brancos, com quebras inusuais de parágrafos e palavras com inicial maiúscula ao acaso, para acentuação de significados. O sinal de + serve como novo sinal de pontuação para o encadeamento das partes da narrativa. Aline Bei constrói sua própria linguagem, permitindose romper com a mancha contínua da prosa na folha de papel, para ressignificar o sentido poético da metáfora por trás do“ peso do pássaro morto”.
COMO SE FAZ UMA NOVELA { ENSAIO } | MIGUEL DE UNAMUNO | TRAD. LUCAS PICCININ | ED. UFPR | 2017
Engana-se quem pensa que Miguel de Unamuno pretende ensinar de modo formal e aristotélico como se escreve uma novela ou qualquer gênero narrativo. O autor de Vida de Dom Quixote e Sancho se propõe, na verdade, a construir um“ novelo”, termo não empregado por ele, mas que aqui empregamos para dar sentido à confluência de história, religião, política, filosofia, poesia. Escrito entre 1925 e 1927, Como se faz uma novela veio à lume em situação de exílio vivenciada por Unamuno em Hendaye, cidade da fronteira entre Espanha e França. Exílio sofrido em razão da perseguição do ditador espanhol Primo de Rivera. Unamuno iniciou a obra em Paris. E é na capital francesa que seu personagem“ U. Jugo de La Haza”, uma espécie de alter ego, pontilha o discurso. Como se faz uma novela serve como espaço para que Unamuno reflexione com o leitor sobre as relações entre literatura e política, entre narrativa e história, bem como acerca do nacionalismo espanhol diante do País Basco, demonstrando a força da literatura nessas encruzilhadas. A edição vem acompanhada ainda de um texto de Jean Cassou sobre o escritor espanhol e um prefácio do tradutor, além de diversas notas explicativas.
{ voz da literatura } n. 2 | junho | 2018
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