V Grandes Escolhas Junho 2022 | Page 4

luis lopes

editorial A cor do vinho

Parecendo não lhe dar grande importância , a verdade é que o consumidor ( e , por arrasto , o mercado ) continua a olhar para a cor de um vinho ( seja branco , rosé ou tinto ) como um factor importante na avaliação da qualidade geral do produto . Mas será que é mesmo assim ? Existem cores ( ou intensidades de cor ) certas ou erradas ?

luis lopes

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A cor , enquanto atributo qualitativo na avaliação de um vinho , não é uma coisa recente . Na cultura do vinho do Porto , por exemplo , a intensidade de cor foi , durante séculos , o primeiro indicador qualitativo na apreciação de um vinho , só depois vindo o aroma e sabor . Ainda hoje , muitos provadores ao olharem para um Porto Vintage condicionam desde logo a sua avaliação pela intensidade da cor . Tão importante era ( ou é ) este factor que se tornaram famosos os “ concentrados ” de baga de sabugueiro que alguns lavradores durienses tradicionalmente juntavam aos seus vinhos para lhes aumentar a cor e , consequentemente , o seu valor junto dos compradores de Gaia . Mas a obsessão pela intensidade corante não se resumia ao negócio do Porto . Nos anos 60 e 70 do século XX , sobretudo , também os vinhos de mesa transacionados a granel por todo o país eram frequentemente “ tintados ” para aumentar o seu valor . Nem sempre foi assim , porém . No final do século XIX e durante a primeira metade do século seguinte , a forte influência da cultura francesa junto das elites nacionais , levou a que muitos agentes com responsabilidades no sector do vinho privilegiassem a delicadeza em detrimento da potência , colocando no lugar mais elevado do podium vinhos com pouca cor natural , como os tintos de Colares , do Dão ou de Lafões , os palhetes ( mistura de uvas brancas e tintas ) ou os sofisticados claretes , estes últimos o mais próximo que havia dos famosos tintos abertos que Bordéus sempre fez até ao advento da “ parkerização ” dos anos 80 e 90 . Demos um salto na história até aos dias de hoje . E o que encontramos ? No que aos tintos respeita , podemos assumir que a importância conferida à cor varia em função do segmento de preço em que o vinho se insere . Os vinhos mais simples e baratos são oriundos de produções vitícolas com elevados rendimentos por hectare e , portanto , necessariamente menos concentrados e com menos cor . Mas o consumidor que paga € 3 ou € 4 por uma garrafa valoriza bastante a cor , que associa de imediato a vinhos mais ambiciosos . Portanto , um vinho de cor intensa nesse segmento de preço tem sucesso garantido , sobretudo se tiver também macieza e doçura , claro . A cor continua a ser muito importante nos segmentos superiores , de € 10 , € 20 , € 30 ou acima , mesmo que muitos consumidores não o admitam . Cor é concentração , concentração é qualidade , acredita-se . Porém , à medida

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