OLHARES PARA O MUNDO
Inês Bogéa, diretora artística
da São Paulo Companhia de Dança
Quem dirige uma companhia de dança experimenta sempre a sensação de trabalhar no movimento. Quer dizer: cria movimentos pelas escolhas dos coreógrafos, bailarinos, figurinistas, cenógrafos, iluminadores, fotógrafos... e de muitas outras pessoas que vêm integrar a equipe para que a dança ganhe corpo.
Nos bastidores da São Paulo Companhia de Dança, criada pelo Governo do Estado de São Paulo em 2008, há diferentes tempos: de ensaios, de aprendizados, de criação, de divulgação, de registro, de memória e de dança. É nessa vida de entrega de corpo e alma que o trabalho tem de se dar. Como diretora artística apresento as ideias e os caminhos que vamos trilhar e, na escuta dos meus pares de trabalho, descubro a maneira de fazer esta Companhia cada dia mais dançante, seja nos palcos, nos bastidores, nas palavras ou nas imagens.
Os bastidores do cotidiano na sede da companhia são distintos dos que ocorrem nos teatros. Na sala de ensaio temos uma página em branco que se reconstrói e se preenche a cada dança que surge do corpo a corpo das pessoas que habitam este lugar. Os bailarinos começam seu trabalho com aula de balé cássico, seguem para os ensaios das diferentes obras do repertório ou participam de novas montagens, de ensaios fotográficos ou filmagens. Se alguém falta ou se machuca a dinâmica se modifica e se refaz dando novas oportunidades a outros artistas. Muitas vezes - principalmente perto das apresentações - temos a pressão do tempo e a urgência de alcançar o estágio ideal de cada coreografia neste momento, pois a dança é viva e cada dia ganha novas dinâmicas.
Sim, no teatro também começamos o trabalho com uma aula de balé, depois colocamos a obra no espaço do palco, fazemos o ensaio geral, e seguimos para a preparação com maquiagem, figurinos, aquecimento. E cada artista tem seu ritual antes de entrar em cena, alguns ficam quietos, outros ensaiam os trechos mais difíceis, outros passam a coreografia na cabeça, ouvem música...
Nos teatros a intensidade emocional é maior: o desenho da dança interage com a luz, com o cenário, com o figurino e se refaz no sentido e na percepção de cada um de nós que viveu os bastidores da sala de ensaio e agora vive esta nova realidade na qual as ideias esboçadas ganham mais corpo. Se há imprevistos a dança continua no ritmo que vier. Na coxia, espaço ao lado do palco que habitamos antes de entrar em cena, toda a história vivenciada na construção do espetáculo passa por nós. E no palco encontramos, além dos olhares cúmplices dos nossos parceiros de trabalho, os olhares do público que são um novo espelho onde nos vemos refletidos. E não podemos esquecer que no palco o trabalho dos produtores, técnicos de palco e da comunicação se tornam mais visíveis. Na sede da Companhia o tempo deles é também de construção dessa dança que se intensifica no teatro.
Nos bastidores vivemos sonhos, suor, entregas, paixões. Também frustrações, lágrimas, cansaços, dores. Nos olhos dos nossos parceiros nos desnudamos todos os dias e nossa humanidade vem à tona pelas potencialidades e fragilidades de que somos compostos. Juntos construímos mundos em movimentos. Na roda viva do cotidiano inventamos um novo tempo permeado de aprendizados, refazeres, encontros e desencontros.
Do dia a dia da sala de ensaio para o dia a dia dos teatros vivemos intensamente a arte da dança, que ganha novos contornos pela presença ou ausência de cada um que vai e que vem. Entre identidade e diferença, entre possibilidade e recusa, a dança nos ensina não só novas formas de beleza, mas novos olhares para o mundo.
Fotografia Guilherme Licurgo
Styling Leticia Cazarré
Produção de Moda Luise Federman
Beleza São Paulo Companhia de Dança
Film Juliana Helcer
Figurinos Masculinos Fernanda Yamamoto para a coreografia "Ngali..." de Jomar Mesquita com colaboração de Rodrigo de Castro
Elenco Feminino Luiza Yuk, Luciana Davi, Ana Paula Camargo, Beatriz Hack, Paula Alves
Elenco Masculino Hiago Castro, Luca Seixas, Lucio Kalbush, Vinícuis Vieira, Anderson Lima