Scripsi Scriptsi Número 2 | Page 26

Para Proust, tudo na arte depende daquilo a que ele chama, de forma alargada, a “visão”. No final do Tempo Reencontrado, Proust vai explicar a Literatura recorrendo à pintura: Editora Anticítera “Graças à arte, em vez de contemplar um mundo único, o nosso, e temos tantos mundos à nossa disposição como temos artistas originais, as diferenças entre estes artistas é maior que as que rolam no infinito e mesmo depois de muitos séculos de se ter extinguido a fonte de onde emanavam, que se chamasse Rembrandt ou Vermeer, ainda nos enviam o seu raio especial. (TR) Da mesma forma, numa passagem anterior, já o tinha dito de forma clara “captar a nossa vida; e também a dos outros; pois o estilo para o escritor como para o pintor é um problema, não de técnica, mas de visão. (Notre vie; et aussi la vie des autres; car le style pour l'écrivain aussi bien que la couleur pour le peintre est une question non de tecnique mais de vision) T.R. Rembrandt e Vermeer são as grandes referências artísticas de Marcel Proust. De Rembrandt, Proust vai “imitar” a variação de um tema único: cada quadro é uma recombinação dos mesmos elementos – esse processo também está presente na Busca: as jovens, as diversas igrejas, as sonatas são variações de uma mulher, uma igreja e uma única sonata. De Vermeer, Proust vai “imitar” a pintura por camadas, a Busca do Tempo Perdido toma a sua espessura e densidade dos diversos retoques, correcções, sublinhados, reescritas, reconstruções e regressos temáticos. Ao contrário da pintura dos dois mestres, a obra de Proust, simplesmente, decorre no Tempo , tempo esse que, no fundo, será eliminado. O escritor Marcel Proust nasce no momento em que começa a ver a realidade pelos olhos de um artista, no momento em que a arte se confunde com a vida. O escritor vai emprestar a sua vida à arte, é a famosa tese do “artista espelho”. As lições da pintura são transpostas para a escrita, abolir a fronteira entre pintura e escrita é equivalente e acompanhado pela abolição da fronteira entre “vida” e arte. A arte é a abolição das fronteiras, de todas as fronteiras. "O Terceiro Dia", por Cléber Pacheco "(DES)Caso com a poesia: inquietações", por Maurício Gomes "Vista de Delft". (1660-1661). Vermeer. 26 26 27 27