Outra beleza é a fotografia (de Joseph La Shelle) em preto e branco que passeia por ambientes chiques
e extravagantes de uma Nova York de milionários, publicitários e artistas. O preto e branco foi uma arte
cinematográfica que se perdeu, infelizmente, mas que deixou monumentos de refinamento e sutileza como
esse. Tudo ajuda as composições de La Shelle, e principalmente Gene Tierney, cuja Laura jamais usa uma
roupa que não fosse elegante até os dias de hoje. Ela é realmente fina, etérea e tudo que o enredo pede.
Só não é interpretada com convicção e muito talento por Tierney. A explicação: ela não acreditava no filme,
achava-o predestinado ao fracasso e não gostava da idéia de interpretar uma mulher num retrato, opunha-
se a ser uma coisa mitificada, endeusada. Passa um pouco “morta” pelo filme, mas ironicamente, essa
impassibilidade que ostenta acaba sendo providencial para a história – ela é um lindo objeto sobre o qual as
projeções se efetuam, a do espectador e a dos personagens.
“LAURA”: ASTÚCIAS E SEGREDOS DE UM CLÁSSICO DO CINEMA “NOIR”
Quando, pela primeira vez, se vê um filme clássico de que se ouviu falar por muito tempo, há uma enorme
expectativa seguida de certa inevitável perplexidade. No meu caso, tendo conhecido “Laura” primeiro em
alguma exibição de tarde da noite na televisão, lembro-me que a impressão não foi boa: por que tantas loas
para um filme policial convencional como aquele? – pensei, achando que a história era emperrada e os
diálogos pouco atraentes. Os anos se passaram e só com a indústria dos DVDs de clássicos que saem bem
cuidados e com muitos extras consolidada, é que fui compreender melhor o filme. Não o considero uma
obra-prima, mas que é uma produção intrigante e que merece ser vista, não há dúvida alguma.
É reconhecidamente um clássico do “noir”, mas não tem uma “femme fatale” nem outros sinais típicos
do gênero. “Laura”, na verdade, é um filme que parece transcender o gênero, embora carregue alguns de
seus estilemas. Quando se vê o filme mais de duas vezes é que se nota que ele, essencialmente, trata de
uma mistura de encantamento romântico, morbidez e decadência. E, na verdade, é um filme sobre desejos
reprimidos e freudianamente sublimados, concentrando-se na projeção da homossexualidade neurótica e
idealista de um homem, o colunista Waldo Lydecker, vivido pelo ator Clifton Webb.
O filme pertence a um personagem estranho, e por isso é tão lembrado. As astúcias do diretor Otto
Premminger para falar desses desejos de Waldo Lydecker são no