Política! A vida é maravilhosa, porém de repente tudo se vai. Como
diz o Álvaro de Campos, vulgo Fernando Pessoa, depois que nos
formos só seremos lembrados em duas datas, aniversariamente:
quando fizer anos que nascemos e quando fizer anos que morre-
mos; mais nada, mais nada, absolutamente mais nada.
Um nasceu cem anos depois do outro. Os dois completariam,
lado a lado, 300 anos neste mês em que estamos. Marx e meu
amigo que se foi em março de 2015, o camarada Armênio Guedes.
Tenho agora em minhas mãos os textos de um livro a ser publi-
cado em homenagem ao centenário do Armênio, 33, escritos por
amigos seus de verdade.
Armênio nasceu no dia 30 de maio de 1918, em Mucugê, na
Bahia. O velho Marx, no dia 5 de maio de 1818, em Tréveris, na
Alemanha. Estive seguidamente com os dois.
Ao alemão fui apresentado por meu pai – que também nasceu em
maio, no dia 9, em 1916 – quando tinha 15 anos. Entregou-me um
livro de Marx – não me recordo se o Manifesto ou outro –, recomen-
dando-me que o lesse com atenção. Em 1955, a televisão e a internet
ainda não existiam como instrumentos do modo de produção social
que está por aí. Os jovens liam, alguns também escreviam.
Do Armênio aproximei-me nos anos 1980. Quando ele se foi,
escrevi um pequeno texto no qual afirmei que lá se fora o Júlio, o
Tio, como o chamavam seus companheiros de exílio – Cecília, sua
mulher, minha amiga, passou a vida toda chamando-o de Júlio!
Afirmei, então, que, naquele momento, era como se eu corresse
os olhos, dominando o tempo, por inúmeros instantes do passado.
Em Paris, em minha casa em Tiradentes (MG), em São Paulo.
Armênio ensinando o futuro à minha filha. A mim recomendando
prudência, mais de uma vez.
Lá se fora o amigo mais sereno. Seu olhar desdobrava espe-
rança, paz. Revolucionar o mundo, construir a fraternidade, mas
em paz, harmonia e paz. Alguns amigos em volta do seu corpo, de
repente o chão se abrindo para que a matéria fosse levada para
sempre. Antes, durante breves instantes, confraternizamos. Esti-
vemos mais próximos do que nunca, entre nós e a ele. Uns foram
capazes de dizer algumas palavras. Faltaram-me forças para
mencionar o quanto o meu velho camarada me ensinara, para ao
menos sussurrar a palavra amizade. Alguém trouxera, para ser
172
Eros Roberto Grau