rou aspectos do projeto, sem o rejeitar de todo, lançando mão de
uma comparação entre a experiência brasileira e as experiências
das “sociedades as mais liberais”, onde a “simples habitação de
um estrangeiro em qualquer país não o torna cidadão dele”.
Embora reconhecesse que os portugueses eram uma categoria
especial de estrangeiros, porque “fazíamos uma só nação, somos
seus filhos, seus parentes e viemos do mesmo tronco” (AAC II, p.
86), recomendava prudência, justamente porque compreendia que
o sentimento de nação, de pertencimento, era muito mais complexo
do que o local de nascimento ou de residência. Em outras pala-
vras, envolve um sentimento profundo de reconhecimento de si
mesmo na nação:
O amor de nossos lares, o afeto do primeiro berço, onde se
gastam os anos de nossa meninice, a afeição à pátria que nos
viu nascer, são sentimentos naturais, que podem sim calar-se
à vista de outras circunstâncias, mas que sempre existem
cobertos nas almas bem formadas. (AAC II, p. 86).
Logo, continua o deputado, o reconhecimento da nacionalidade
brasileira deveria ser feito com cautela, tendo em vista que ensejava
aspectos muito fundamentais, como a garantia de cidadania:
À vista disso bem se veem que caem por terra os especiosos
argumentos e exclamações contra a violação das garantias da
liberdade pessoal do cidadão. Não é contra o cidadão que é
ajustada a providência, é contra estrangeiros, e estrangeiros
suspeitos [...] afeta só aos estrangeiros portugueses, e não aos
brasileiros. [...] Eu, por minha parte, creio que a medida, odiosa
como é, contudo é exigida pela necessidade. A nossa situação é
nova, e requer mais cuidado do que pensamos. (AAC II, p. 86).
A “nova” situação do Brasil buscava forjar um nacionalismo
que pretendia definir o “ser brasileiro” sem, contudo, “deixar de
ser filho da civilização” (GUIMARÃES, 2007, p. 84). Nesse
processo, necessariamente foram acomodados mal ou bem
elementos modernos – como a noção de cidadania e de nação
soberana – e tradicionais – como as especificidades de uma
ex-colônia cuja elite política fez parte da administração do Estado,
e que via os “portugueses do lado de lá” do Atlântico como irmãos,
pelo menos até às vésperas 3 da Independência.
3 Até que chegassem as notícias do Brasil com a rejeição do povo aos decretos
das Cortes, a deputação brasileira em Lisboa pouco protesto havia feito acerca
de tão controversas medidas. CARVALHO, Manuel E. Gomes de. Os deputados
Quem vai ser brasileiro?
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