Revista Tecnicouro Ed. 327 Novembro - Dezembro 2021 | Page 80

OPINIÃO

Colunista

A offshore de Johnny

Este espaço tem sido utilizado para relatar uma sequência de peripécias jurídicas e fiscais de um personagem que já se tornou conhecido dos prestigiados leitores . O incansável e sempre insatisfeito Johnny não conseguia sossegar na sua sanha rocambolesca naquele estranho país , que chegou a usar vermífugo para combater vírus . Amava , cada vez mais , estranhos seres do mundo empresarial e seus cânticos motivacionais .

Como gostava de propagar em
Marciano Buffon advogado Tributarista , professor do PPGD da Unisinos marciano @ buffonefurlan . com . br
suas palestras , ele próprio se tratava de um “ case de sucesso ”, pois de um reles advogado que só queria ter um jatinho para conquistar um amor verdadeiro , Johnny criara uma inusitada religião ( Non mortis ); investira os lucros na extração de minérios e terminara por criar gado para exportação ; além de , também , tornar-se um artista e constituir uma pseudolocadora de automóveis . Diante de uma “ culta ” plateia , vivia momentos inenarráveis de prazer , aos quais repetia suas palavras decoradas em inglês , recitava suas frases de efeito e zombava daqueles que , segundo ele , haviam perdido tempo com estudo . Ao final , com a plateia em êxtase , cantava o hino que havia sido composto para seus empreendimentos , enquanto ouvia urros de prazer desvairados .
Claro que havia alguns que o achavam caricato com seu flamante chapéu verde / amarelo , botas de couro de pyton e um cinturão , no qual portava duas pistolas , mas isso não importava ; para ele , tratavam-se apenas de invejosos que não alcançaram seu sucesso e estavam a gastar a vida em busca de cultura e sequer livres eram , diferentemente dele , para proferir palavrões e ser venerado por seus seguidores por esta autenticidade .
Porém , sentia falta de algo que , até então , não tivera . Como já amplamente explicado em outros textos , sempre assessorado por seu supertributarista , Jonnhy não havia sido admoestado pelo Fisco e pelas leis daquele país , porque nem mesmo era necessário fraudá-las para se dar bem e pagar pouco ou nada de tributos . Ocorre que isso já não lhe era suficiente . Faltava-lhe o prazer do ilícito . Às vezes , isso lhe causava certa angústia , sentia-se igual aos trouxas
de seus detratores que pagavam religiosamente seus impostos .
Assim , o desejo encontrou-se com a necessidade . Jonnhy vinha tendo dificuldade de administrar as doações e as coletas recebidas em sua igreja - Non Mortis . Obviamente , nada era oficialmente registrado na contabilidade da empresa ( ops ! de sua igreja ). Já não conseguia controlar os vultosos valores , pois já esgotara os “ laranjas ” que ocultavam suas contas e o tal bitcoin não lhe parecia muito seguro , depois de ter perdido uma fabulosa quantia aplicando com uma empresa que “ por acaso ” denomina-se Pirâmide do Egito .
Por indicação de seu consultor , fez contato com uma empresa especializada em gerir recursos de afortunados em paraísos fiscais . Foi orientado , então , a constituir uma offshore nas Ilhas Intocadas da Rainha , pois ninguém ficaria sabendo , não haveria tributação e os valores ficariam resguardados dos riscos de uma quebra da economia daquele país , cujo Ministro do Dinheiro Real era considerado um gênio portador de todas as respostas , mas que estranhamente não fizera a tal economia decolar .
É certo que , sem ter origem legal de seus recursos , Jonnhy precisava usar de alguns artifícios para enviar o dinheiro “ virtual ” para aquela ilha a qual nunca havia ouvido falar e muito menos imaginava em que lugar do mapa se localizava . Porém , esses eram pequenos entraves que logo foram superados mediante transações triangulares com algumas instituições financeiras e utilização de moedas virtuais , além do repasse de algumas “ comissões ” pagas no exterior .
Enfim , Jonnhy agora ( ou por ora ) estava satisfeito , havia , finalmente , aplacado a inveja que nutria de alguns amigos que tinham suas offshore em paraíso fiscal e que , depois do segundo whisky , disso gostavam de se vangloriar . Agora ele também fazia parte desse clube e era titular da Shore Offs , sua offshore nas Ilhas Intocadas da Rainha . Ah ... como ele adorava nomes em inglês ! Aliás , iria determinar que no seu hino - o qual era cantado obrigatoriamente por seus “ colaboradores ” todos os dias pela manhã - fosse acrescido o nome de seu novo empreendimento do além-mar . Johnny era muito criativo ... Como era estranho aquele país ...
80 • novembro | dezembro