Revista Sesvesp Ed. 105 - Janeiro / Fevereiro 2012 | Page 3

editorial Leis “tapa-buracos” e os apuros da atividade empresarial U José Adir Loiola Presidente do SESVESP Questionamos aqui como ficam os princípios da ‘livre iniciativa’, também expressos na Constituição Federal, quando o Estado começa a criar dispositivos ou dar vazão a entendimentos que comprometem a capacidade de trabalho das empresas tão e somente para reparar sua própria incompetência em garantir ‘o desenvolvimento nacional’?” ma das astúcias para tentar encobrir um erro, omissão ou negligência é imputar a outrem responsabilidades que lhes cabem, agindo com dissimulação, partindo para acusações, apegando-se a detalhes legais, distorcendo interpretações, até que sejam invertidos os valores e o jogo mudado. O acusado passa a acusador, a vítima a ré. Qual seria outro entendimento possível diante de algumas jurisprudências que criadas no campo do Direito do Trabalho, responsabilizando transportadoras pelos motoristas vitimados em função das péssimas condições das estradas brasileiras? Com base na figura da “Responsabilidade Objetiva”, o Tribunal Superior do Trabalho tem considerado que compete ao empregador indenizar funcionários que exerçam atividades de risco e venham a sofrer algum tipo de dano, independente da culpa relacionada ao incidente, ou, no caso das transportadoras, de que se reconheça a precariedade das estradas como a causa principal dos acidentes. Quanto à negligência ou omissão do Estado, nada é dito ou cobrado, mesmo que lhe caiba, por princípio, assegurar condições ao pleno desenvolvimento econômico e social do País. O Sindicato das Empresas de Segurança Privada do Estado de São Paulo (Sesvesp) acompanha com preocupação essa tendência que se desenha junto aos Tribunais do Trabalho. Conforme a leitura dos magistrados, a empresa que atua em áreas que possam implicar riscos para terceiros assume, per si, a obrigação de assegurar a integridade física dos colaboradores, pouco importando se o contexto dos acontecimentos vier a extrapolar as prerrogativas e a capacidade de ação das organizações. Nessa linha de interpretação, a empresa de segurança privada, por exemplo, poderia responder integralmente pelo vigilante ou terceiro caso sejam vitimados em um entre os muitos flagrantes de assaltos que infelizmente compõem o cenário diário das cidades brasileiras. Entendem os tribunais que o Caput do artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição Federal, que trata da “Responsabilidade Subjetiva” (com culpa direta do empregador), prevê a possibilidade de ampliar o arco da proteção social ao trabalhador. A inversão de valores se dá a partir do momento em que o Estado, ao não dar conta de cumprir com os princípios fundamentais da República expressos na Constituição Federal, entre eles “a dignidade da pessoa humana” e “os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa”, transfere toda a responsabilidade à sociedade e suas organizações, exigindo-lhes que cubram os buracos deixados por sua omissão ao longo do caminho (buracos esses, sintomaticamente, materializados nas estradas brasileiras).É uma distorção que pode ser observada ainda em outros dispositivos legais que vêm criando dificuldades ao dia a dia do segmento de segurança privada: a Lei do Aprendiz (incompatível com um setor que exige mão de obra altamente treinada e qualificada); a “Lei de Cotas” (que deixa um problema às empresas que precisam compor 95% de seu efetivo com vigilantes em plena capacidade física e mental); e a questão do rodízio de veículos na cidade de São Paulo (que nos abre exceção apenas para a escolta, como se pudéssemos escolher a hora para o atendimento de nossas demandas). Diante deste quadro, questionamos aqui como ficam os princípios da “livre iniciativa”, também expressos na Constituição Federal, quando o Estado começa a dar vazão a entendimentos que comprometem a capacidade de trabalho das empresas tão e somente para reparar sua própria incompetência em garantir “o desenvolvimento nacional”? De nossa parte, empregando quase meio milhão de trabalhadores com registro em carteira em todo País, temos cumprido com nosso papel social, auxiliando a “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”. No mais, resta ao Estado assumir os princípios, objetivos e funções prescritas pela Constituição da República Federativa do Brasil e deixar de apenas a iniciativa privada com leis e entendimentos que visem a tapar seus buracos. janeiro / fevereiro 2012 |3| Revista SESVESP