Revista Sesvesp Ed. 103 - Setembro / Outubro 2011 | Page 3
editorial
Pregão Eletrônico:
Vício de origem gera distorções,
pune empresas e cidadãos
O
José Adir Loiola
Presidente do SESVESP
“Se o Artigo 37
da Constituição
Federal preza a
obediência da
administração
pública direta
e indireta “aos
princípios de
legalidade,
impessoalidade,
moralidade,
publicidade e
eficiência”, nos
cabe perguntar
onde estaria
dada a garantia
de reciprocidade
desses
princípios
na prática
dos Pregões
Eletrônicos?”
noticiário recorrente sobre a
má utilização dos recursos e
do patrimônio público deixa no ar a sensação de que
os ralos da corrupção se alastram como
epidemia pelos quatro cantos da administração do Estado brasileiro em nível
federal, estadual e municipal. Nas últimas décadas, entretanto, o Estado vem
aprimorando os mecanismos de controle sobre o patrimônio, algo que explica,
em parte, essa profusão de flagrantes de
imoralidade ou ilegalidade na aplicação
de dinheiro tão caro ao contribuinte.
Um dos marcos desta mudança está
na Constituição Federal de 1988, a qual
determinou a contratação de obras e serviços, além das compras e alienação, por
meio de processo de licitação pública. Está
aí a origem da modalidade do Pregão, tipo
de concorrência que entrou em cena em
âmbito federal em maio de 2000, por meio
de Medida Provisória, e que agora atinge
estados e municípios.
Em 2005, esta modalidade cedeu lugar
ao Pregão Eletrônico, acompanhando a
evolução da internet no Brasil e agilizando
ainda mais o processo. De forma geral, o
Pregão ajudou a conferir maior transparência às aquisições de produtos e serviços. No entanto, alguns maus resultados
colhidos hoje sobre a qualidade dos serviços prestados aos cidadãos denunciam
que o formato apresenta um grave vício
de origem e prejudica o cidadão: ao forçar
o fornecedor a praticar o menor preço, ele
inviabiliza o cumprimento do contrato.
Ou seja, para se proteger do abuso contra
preços extorsivos, o poder público acabou
gerando um sistema irrealista e devastador contra o prestador de serviços.
O quadro é particularmente dramático junto das empresas de segurança privada. O Estado representa seu principal
mercado tomador, demandando espe-
cialmente mão de obra qualificada para
cuidar da vigilância e do patrimônio de
parques, sedes administrativas, polos de
tecnologia, centros educativos, culturais
e sociais, escolas, bancos, hospitais, fundações, autarquias, entre muitos entes
públicos. Mas em lugar de exigir habilitação e preços compatíveis a um serviço
especializado, a exemplo do que é feito
nos rigorosos processos seletivos das polícias civil e militar, o Poder Público usa
tão e somente o critério do menor preço
para selecionar a empresa que irá gerir e
proteger o bem coletivo.
Se compararmos os dados de pesquisa
realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras
de São Paulo (Fipecafi) sobre o custo unitário da mão de obra por tipo de serviço
de vigilância, observaremos que os preços
pagos pela área pública estão no limite ou
abaixo do dispêndio mínimo que as empresas realizam por trabalhador. É importante
observar ainda que os valores da pesquisa
não incluem gastos com supervisão, treinamento, gerenciamento, dividendos e insumos das prestadoras. Tampouco envolvem
custos adicionais gerados pela morosidade
ou atraso nos repasses dos pagamentos, o
que é muito comum entre os contratantes
públicos. Assim, na somatória final, não
surpreende que o prestador - que precisa
disponibilizar até quatro trabalhadores por
posto de serviço, pagar salários, uniformes,
benefícios, oferecer treinamento, recolher
encargos e tributos, conceder férias, bonificar com 1/3 do salário e com o 13º etc. - se
veja à beira da insolvência. Se o Artigo 37
da Constituição Federal preza a obediência
da administração pública direta e indireta
“aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”,
nos cabe perguntar onde estaria dada a garantia de reciprocidade desses princípios
na prática dos Pregões Eletrônicos?
setembro / outubro 2011
|3| Revista SESVESP