"Aonde você está?" pergunta Irene (Marília Pera). "Eu to fudida, na rodoviária", responde Dora a amiga, completamente brava.
As duas sabem dos riscos de fazer uma viagem dessa. É realmente belo e corajoso a escritora largar tudo para ajudar o menino a viajar. Parece que Dora tem medo, mas não exita voltar atrás.
Possivelmente ela está vivendo algo que sempre quis, mas nunca teve coragem de realizar. Ou porque a vida difícil não deixou. Ou melhor, a sociedade não tolerou.
A personagem de Montenegro enfrenta diversos dilemas durante a trama. Aliás, Dora não vive bem financeiramente e não tem ninguém para compartilhar as contas. É sozinha.
Aliado a isso, Central do Brasil é o reflexo do fluxo migratório brasileiro. De acordo com o IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a migração brasileira é mais expressiva do Nordeste para o Sudeste.
O principal motivo dos nordestinos trocarem de região é a busca por melhores condições de vida. Fatores como mercado de trabalho e melhor nível educacional pesam na hora de tomar a decisão.
Nesse sentido, o longa é um dos poucos a retratar isso e retomar a moda de filmes no nordeste. Dois anos depois, em 2000, o filme Auto da Compadecida chegava ao sucesso. As demais obras: Eu, tu, eles (2000), A Libesla e o Prisioneiro (2003), Deus é Brasileiro (2003), Amarelo e Manga (2003) e Ó Pai Ó (2007) também abordaram a cultura nordestina e foram prestigiadas.
De certa forma, Central consegue americanizar os épicos Vida Secas (1963) e Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964).
O road movie é acompanhado por uma excelente trilha sonora. Antonio Pinto e Jaques Morelenbaum conduzem de maneira exemplar assim como Walter Carvalho surpreende na direção de fotografia.
Em relação ao diretor Walter Salles, que também fez um excelente trabalho, o longa impulsionou sua carreira no exterior. Em 2012 ele lançou o ótimo On The Road, outro filme de jornada intensa e sentimentalista.
Certamente, uma inspiração de Central do Brasil.