Revista LiteraLivre Revista LiteraLivre 9ª edição | Page 108

LiteraLivre nº 9 – Maio/Jun de 2018 grandes que fazemos para 20/30 pessoas, de guerra. As pequenas de 7/8 ocupantes, de pesca. Eles passaram por muita terra e tempo desconhecido. Dividiram-se em grupos seja por desavença seja por conquista na terra nova. — Verdade Ypané. Na origem fomos um só corpo. Os M’Bayas, dividiram quando aqui chegaram, perdendo um pouco de sua força. O grupo que nos criou, optou por viver em margem de rio, em região pantaneira, lugar que a água invade a terra e depois devolve fertilizada. O curso de água doce que adotamos era o rio Paraguai. Sempre demoramos pouco em terra firme, nosso lar foi sempre a água. Deixamos ao irmão de sangue Guaicuru a terra sagrada. Na água nos defendemos e temos inúmeras glórias refutando o invasor branco. Nossa técnica inigualável de usar a canoa em movimento transversal, quase submergindo, transformando o fundo duro de nosso transporte em escudo contra o pau de fogo do homem branco. Conseguíamos lançar flechas e lanças mais rápido que eles, três vezes mais, no recarregar de suas armas pessoais. Nosso povo é guerreiro pelo que acredita. Vemos o invasor como ameaça de nossa existência. Triste saber que estávamos corretos. Procuramos proteger o objeto amarelo reluzente que os brancos tanto procuravam, em função da destruição que praticam. O homem branco desbrava a mata com violência e sem respeito. Chamam a nós e aos irmãos de pele, de “selvagens”. Defendemos o lugar que só nos acolhe e dá sentido. Eles se servem. Nunca demos perdão. Nossos deuses são de luta. Há entre nós o lema: nunca deixe um irmão para trás. Nunca fizemos isso e jamais o faremos. Jure por esta palavra meu neto. Jure por nossos e por toda a verdade daqueles que se foram. Viver é dar valor ao que nos mantém e serve. A floresta e o rio que a mantém viva, deve ser a seiva da planta pela existência. — Avô amado. Esta promessa é compromisso. Venho além de requerer o saber, falar do homem branco português de nome Antonio Correa Barbosa que veio em sigilo me procurar. Sabe que perdi meu pai jovem, seu filho, nas andanças de nossa tribo pelos lados da fronteira tupi. A tarefa de conduzir nossa gente agora é minha. Sei que de onde vem um, virão vários. Em nossas lutas, bravos que fomos, sempre que destruíamos as monções do inimigo, outras tantas se formavam. Maiores e mais fortes. Vejo-me na dúvida, grande alma. Ou o ouço e firmo fileiras com ele, ou refuto conhecedor de uma tragédia anunciada. — O líder não faz nada fácil. É julgado por quem só vê o imediato. Meus braços falam pela repulsa e pela morte do branco destruidor. Fomos aliados dos castelhanos contra os portugueses. Recebemos traição, escravagismo e submissão. O português é igual. Os pajés dos brancos disseminam língua doce e céu dourado, mas, forçam nosso povo e nossos irmãos em trabalhos de destruição da nossa cultura. Neto meu. Dura a sua batalha. Não serei eu quem 103