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LiteraLivre nº 6 – novembro de 2017
céu. Porém, nunca lhe deu muitas esperanças. Ela era uma celibatária
convicta, não estava interessada em relacionamentos sérios. O céu sofria e,
vez em quando, chorava estrelas cadentes.
As luzes dos postes abriam os olhos em um despertar em cadeia. Ficavam a
perscrutar a vida da vizinhança, sempre a observar tudo. Fofoqueiras!
Na janela em frente, um cigarro queimava numa brasa incandescente. No
escuro, era tudo que se via. Não queriam sair da escuridão os lábios que o
amparavam. Melhor. O cérebro nem quer se esforçar para manter um papo
inteligente. Ultimamente, fazia a boca tão somente resmungar contra o jantar
frio, o barulho das crianças e o som da tevê alto demais. Melhor deixar o
silêncio reinar sobre os ambientes. Mudo que é, não perguntava do
encanamento da cozinha, não obrigava a pôr o lixo para fora ou levar o
cachorro para passear. Por isso, é o amigo que todos queriam ter. Além de
guardar segredo sobre tudo. Não abria o bico por nada!
Gatos de rua derrubaram num estrondo uma lata de lixo, rebeldes, não se
espantaram com o ralhar das vozes nervosas. Só desistiram do seu intento
quando uma sandália voou certeira em sua direção. Num miado forte,
reclamaram de sua algoz e abandonaram a lixeira.
Um rádio começou a tocar uma melodia triste. Chorava de dor numa língua
estrangeira.
O ambiente foi tomado por um cheiro de canja delicioso, cujo intento principal
era abrir o apetite do estômago. E o corpo, ainda preguiçoso, levantou-se.
Gigante desperto pela necessidade básica de comer. Iria em direção ao
alimento. De dentro da casa, surgiu uma voz aguda e forte: “o jantar espera
sobre a mesa da cozinha”. O homem, faminto, pôs fim a este conto: o
estômago a tudo domina. “Quem segue o coração é o pulmão, ninguém mais”,
já dizia Carpinejar. Vida que segue.
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