Revista LiteraLivre Revista LiteraLivre - 10ª edição | Page 67

LiteraLivre Vl. 2 - nº 10 – Jul/Ago. de 2018 Filhote Fernando Neneve Cornélio Procópio/PR Havia tristeza em seu olhar: sentado no banco da praça ele fitava o horizonte sem conseguir enxergá-lo, de fato. Estava escuro e era só meio dia. O Sol, eclipsado por pesadas nuvens de chuva, brilhava timidamente por trás da cortina de ferro: terça-feira estranha para se dizer o mínimo. Estava tão feliz pela manhã: sorria inocentemente enquanto corria atrás das borboletas no jardim. Prometi que iríamos ao parque mais tarde e ele não se continha de tanta alegria. Não é todo dia que se comemora dez anos, não é mesmo? O Sol desta manhã não se parecia em nada com este, o aniversariante menos ainda. Os últimos dias de férias passam sempre muito mais rápido que todos os outros e a realidade começava a bater à nossa porta. Ele adorava comemorar aniversários, ansiava por isso o ano todo. Em Dezembro, ao entrar de férias, ele sabia que viriam as festas de fim-de-ano, as férias inteirinhas e o seu aniversário, em Fevereiro... os dias mais felizes que ele poderia ter. Porém, quando seu aniversário finalmente chegava, ele sabia que teria de enfrentar o ano todo até que as férias chegassem novamente - quando ele compartilhou esse pensamento comigo, no ano passado, fiquei perplexo. As crianças de hoje em dia são muito calculistas, pensei comigo. Sentia saudades da mãe, também. Acho que ele não assimilou muito bem o que aconteceu e creio que ele ainda a espera chegar, todos os dias, aos fins de tarde. Já não chora mais, porém ou pelo menos não com tanta frequência... Eu choro: o peso da saudade é quase insuportável e a pressão que enfrento por ter de sorrir e ser forte ante tudo o que aconteceu é esmagadora. Mas sorrio, enfim, por ele: jamais me perdoaria se a infância de nosso filho fosse roubada por essa tragédia... Mesmo depois de seis meses eu ainda não consigo aceitar o que aconteceu, ou por quê... Mas não havia nada que eu pudesse fazer, nada. Sinto tanto a falta 62