Revista LiteraLivre Revista LiteraLivre - 10ª edição | Page 50

LiteraLivre Vl. 2 - nº 10 – Jul/Ago. de 2018 música preenchendo o ambiente. A dúvida e o desejo, o louco e delirante desejo, a faz tremer. Levanta. Uma pequena mão puxa seu dedo anelar esquerdo e diz: - Mamãe, será que posso pegar mais ketchup? Ela olha para as bochechas rosadas do seu filho. Sua boca está suja com o molho vermelho e seus dedos, engordurados. Seus olhos brilham com a felicidade que somente o amado alimento pode proporcionar. Repara que há areia grudada no seu cabelo suado, provavelmente vinda da grande ventania que pegaram entre o carro e o restaurante. Ela caminha até o balcão, pega alguns sachês de ketchup e volta para sua mesa. Rouba algumas batatas e come, deixando a criança irritada e fazendo-a rir. Tranquila e em paz, olha para a janela. A chuva parou. Precisa tomar seu rumo original, então caminha em direção a porta. Ele toca "Wonderful", no mesmo ritmo simples e calmo. Ela para. Olha para o palco. Percebe que ele a encara. A música que os marcou durante a melhor fase de suas vidas continua sem perder o ritmo. Uma forte corrente de promessas e desejos cruza a distância entre o pequeno palco de canto e a velha porta de saída, mas nada além da música se move nestes elos silenciosos de aço. Ela sorri. Ele sorri. A porta do restaurante abre e mãe e filho saem. A música acaba. Ele escuta o motor do carro ligar e se afastar. Seu coração se acalma. Levanta do velho banco de bar, encosta seu violão no canto da parede e segura o anel de plástico pendurado no seu colar. Inspira, solta o objeto e entra na cozinha. Uma mulher assa um frango enquanto mistura um molho no fogão. Ele a beija. Uma garota aparece correndo e abraça suas pernas. — Papai, papai! Vamos jogar aquilo de novo, papai? O jogo das perguntas? O homem, sorrindo, afaga a cabeça da alegre garota. — Claro que sim, minha querida. Vamos olhar a paisagem? A garota, em cima do ombro do pai, aponta para os carros que passam na rodovia. As luzes dos faróis dos veículos criam grandes rastros claros e pontos distantes. As estrelas brincam no céu escuro. O grande satélite natural, grande e majestoso, brilha intensamente. Ele estica os dedos na sua direção. A lua está do mesmo tamanho de sempre. A mesma lua, o mesmo tamanho. O mesmo tamanho que ela observa enquanto dirige para longe, para sempre. Para a próxima vez. https://www.wattpad.com/user/ArthurKratza 45