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LiteraLivre Vl. 2 - nº 10 – Jul/Ago. de 2018
Qando For Grande, Qero Muito Serr
Ricardo Nunes Simões
Lisboa - Portugal
Todos nós guardamos muitos segredos, nossos e dos outros, e eu creio que
o maior deles é aquele em que, com apreensão, escondemos o que mais
queríamos fazer para o resto da vida, se realmente pudéssemos. À partida, quem
tira um curso de medicina quer, com certeza, exercer enquanto médico e salvar
vidas. Tudo isso é muito giro, mas há que separar, com coerente discernimento,
as vontades dos sonhos. Quem sabe se, possivelmente, o que esta pessoa mais
(e convém realçar o mais) quer, é ser um homem ou mulher bala? Talvez as
pessoas não sejam tão felizes no seu dia a dia por causa disso mesmo, não estão
onde queriam estar, não provam o que cobiçavam provar, não sentem o que
esperavam sentir.
Eu desejo, de alma e coração, tornar-me um copiloto de aviões. Ou de
outra coisa qualquer, desde que seja preciso um copiloto. Não fiquem surpresos,
a razão é muito simples: os copilotos nunca são homenageados e isso perturba-
me. Não são sequer lembrados, a sua existência é nula e vazia. Pode parecer
estranho, ou não, mas é verdade. Os únicos casos em que o nome de um
copiloto vem à tona são aqueles em que há um acidente grave, como a queda de
um avião ou o falecimento de um piloto. São manhas para apanhar um culpado.
Quando o avião aterra em perfeitas condições, ninguém se lembra que ao lado
esteve sempre o cabecilha daquilo tudo: o copiloto. É tal e qual como os assaltos
em que os vilões que dão a cara acabam por ir parar à cadeia, enquanto que o
cérebro de toda a operação, que, através de um Tamagotchi, desligou os
alarmes, os sinais de trânsito e penetrou 763 sistemas informáticos, não ganha
nem um pingo de reconhecimento. As caras dos assaltantes passam em canais
de televisão de todo o mundo, mas os cabecilhas acabam esquecidos. Mas que
raio é que um ladrão de qualidade tem de fazer para ganhar algum
reconhecimento hoje em dia? Eu quero muito chegar ao fim de uma corrida, de
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