Revista LiteraLivre edição especial - 03 | Page 38
LiteraLivre Edição Especial nº 03 - 2019
Fiz das trovas coração
Luisa Costa Cisterna
Calgary/Alberta, Canadá
Quando engasgada com palavras de amor, recorro às letras para me trazer
alívio – meu bem-querer, faço, por você, das trovas coração.
Falar simplesmente não traz consolo; preciso embaralhar as palavras,
sacudi-las e espalhá-las no tabuleiro de papel branco e, como em um quebra-
cabeças, formar a imagem da paixão. Aquele que ama, não vive sem versos e
prosa.
Na madrugada insone, olho para o teto por onde passeiam as sombras dos
galhos, que entram furtivamente pela janela do meu quarto. O amor me acordou,
sempre me pregando essa peça na calada da noite. Uma palavra e mais outra
rimam a saudade que aperta meu peito. Não há descanso, não há sossego. Viro
para o lado na cama macia e observo o bailar da cortina leve. Descarto um verso
e tento outro. Para o amor, só a mais melodiosa canção.
Se o barulho é de sapo ou de coruja, já não sei. O que sei é que as batidas
do meu coração reverberam entre as quatro paredes na batucada da paixão. Se
ao menos eu tivesse o domínio das tantas letras para anunciar meu amor, seria
livre da dor que me consome. A distância é uma lança e o tempo, meu cruel
algoz.
Tento novamente um acordo com as sílabas, mas elas, teimosas, correm
para lados opostos. A brisa, cansada do marasmo, transforma-se em vento forte.
Espalha as folhas secas, que alçam voo e invadem meu refúgio. Quem dera o
vendaval trouxe para mim aquele que longe está. O trovador dentro de mim
pastoreia as palavras para o aprisco dos versos sem conseguir, no entanto, o
rimar do seu amor.
A frustração é grande. Nenhuma cooperação das palavras para me tirar da
angústia. Meu bem-amado tão distante espera de mim esses versos, nossa
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