LiteraLivre nº 2
Essa sua mania de demonstrar independência me fascinava. Confesso
que foi amor à primeira vista. Para não omitir, foi ao primeiro toque e,
sinceramente, acho que o seduzido fui eu. Desde aquela manhã chuvosa
nos vemos diariamente. Ela é um tanto inconstante. Vai para o ensaio –
quer ser atriz, e eu aguardo ao relento, sereno na cara, frio pelo corpo
todo. Alega que, se eu estiver por perto, não se concentra. Quando sai
com as amigas, tomar sorvete ou uma cervejinha, diz que o assunto é
de mulher, e eu quase derreto no sol. E por ela!
- Vou lhe mostrar tantos lugares. As vacas que ordenhei, o arroio em
que pesquei, as árvores frutíferas, as taipas.
Sentia-a tão próxima. Encaixávamos perfeitamente.
- Você é tão macio...
Deslizávamos sob as árvores, onde pássaros trinavam sinfonias, e do sol
emanavam os primeiros raios. Inicia um frenesi. Ela treme, eu trepido.
Emaranhados, apercebemo-nos do cascalho.
- Agora só mais trinta e cinco quilômetros de estrada de chão e então
chegaremos a Alto Bela Vista.
Comecei a ficar preocupado. Toda aquela poeira. Eu não poderia
decepcionar. Ela prometera um “check-up”, mas é tão ocupada...
Finalmente surge um cemitério, a escola, o salão de baile, a igreja em
estilo gótico, uma estátua de enxada na mão, atravessamos um riacho e
paramos em frente a uma vasta casa de madeira.
- Papai, mamãe, este é meu carro novo!
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