LiteraLivre nº 2
Perto
Vítor Leite
Porto, Portugal
Perto não é estar próximo nem junto.
Perto é não saber onde acaba um nem o outro, é um corpo com quatro
pernas e outros tantos braços, e, uma tremenda vontade de entrar na
pele, de rasgar o peito e entrar, qual barco a rasgar ondas na maior
tempestade.
e tu onde estás? Sim, tu que não és!
Transparente e sem cheiro, és longe ou uma hora. Morres no desejo de
ser perto. Morro também. Serei pássaro avião, agarrado a um desejo de
ter, nem importa o quê. Ser mais que uma memória de um desejo e tudo
acaba com o mergulho do sol. Como um eco tudo se repete e repete e
epete pete pet te te te.
Perto. Perto de coisa nenhuma. Rasgo a pele como as memórias,
mergulho no sangue quente da vida. Cuidado, digo-me e mergulho
novamente. Nado neste mar opaco sem ondas, longe de tudo. Navego
como qualquer peixe na corrente, aguardando um maremoto. Sozinho e
longe como uma cama vazia.
Sou todo mãos, bem longe do meu corpo e coladas no teu, debaixo
deste líquido ou pasta, que não se descola. Somos perto mesmo de
olhos fechados, sentimos a saliva do outro na pele, mesmo sem olhos
estás em mim. Perto.
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