LiteraLivre Vl. 3 - nº 18 – Nov./Dez. de 2019
Diego Oliveira
São Paulo/SP
Elevador
Marina tinha uma teoria a respeito de sua vida: Definitivamente não tinha
nascido com sorte. No dia em que nasceu, acabou a luz no hospital e o parto foi
feito praticamente às escuras enquanto o gerador era ligado. Aos oito anos de
idade pegou catapora na véspera do seu aniversário e teve que cancelar a festa
que faria em um parque de diversões. Aos 15 anos, no dia de sua festa de
debutante, caiu da escada e quebrou o braço. O “príncipe”, um ator famoso da
novela das sete com quem iria dançar a valsa, teve uma intoxicação alimentar e
não pôde ir à festa. Marina acabou dançando com seu pai, que teve uma câimbra
e travou no meio da pista de dança. E agora, aos 22 anos, não era diferente. No
último ano, Marina havia sido deixada por três namorados e só no último mês
bateram quatro vezes em seu carro. Para piorar, sua melhor amiga estava
internada na UTI de um hospital com uma doença grave.Marina pedia a Deus
todas as noites, antes de dormir, que as coisas melhorassem e que seu azar
virasse sorte. Mas naquele dia chuvoso e cinzento de março de 2015, Marina
acordou diferente. Assim que abriu os olhos, antes de pensar em qualquer outra
coisa, fez uma promessa para si mesma: colocaria um fim em sua vida. Respirou
fundo, se levantou, escovou os dentes, tomou banho, vestiu sua roupa favorita e
fez o que fazia todos os dias nos últimos cinco anos: Foi até a cozinha, encheu
uma caneca com leite desnatado, pegou duas torradas e espalhou sobre elas
uma leve camada de geleia de framboesa. Comeu tudo em 5 minutos, lavou a
louça e foi para o trabalho. No caminho, o ônibus em que estava quebrou e
Marina teve que seguir a pé. Quando estava praguejando e reafirmando que esse
seria seu último dia de vida, avistou uma nota de 50 reais jogada na rua. No
entanto, antes que pudesse alcançá-la, um garotinho que aparentava ter oito ou
nove anos passou correndo a sua frente, pegou a nota e guardou na mochila.
Chegou ao trabalho cuspindo fogo e contando as horas para voltar para casa e
despedir-se dessa vida. Surpreendentemente foi mais eficaz do que havia sido
em todos os anos em que havia trabalhado naquela empresa. No almoço, comeu
tudo o que tinha vontade e até repetiu a sobremesa. “Dieta pra que se logo vou
morrer?”, pensou ela consigo mesma. No fim do dia, quando encerrou o
expediente, começou sua saga rumo ao suicídio. Marina já tinha planejado o que
faria: iria para casa, subiria até o último andar do prédio quando todos os
vizinhos já tivessem dormindo. Então, Marina abriria o trinco da porta amarela de
ferro, daria alguns passos, subiria no parapeito, respiraria fundo, contaria até
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