LiteraLivre Vl. 3 - nº 18 – Nov./Dez. de 2019
Helison Cavalcante
Belém/PA
Amor no Oriente
Ela só queria trabalhar, mas ele só queria ela. Essa união tão frágil e
desigual, construída por objetivos tão distintos, não poderia resultar em um
desfecho diferente. Agora o corpo dela desfalecia, em solo japonês, estendido em
um chão de lajotas de porcelanato brilhante e, do seu pescoço, jorrava o resto de
um líquido quente, vermelho e insistente, que outrora oxigenava a todos os seus
tecidos, mas que agora apenas contrastava com a sua pele, pálida e fria, e
ruborizava o refinado piso.
Em vida ela era bela, uma ex-dançarina, que estava no auge dos seus 25
anos, possuindo cabelos pretos e cumpridos, pele clara e um rosto angelical.
Buscava trabalhar e fazer fortuna no Oriente, para onde veio recém-casada. Não
conhecia ninguém no país que a acolhera, devido à barreira linguística que ainda
tentava superar e, portanto, foi atacada pelo marido, durante uma crise de
ciúmes completamente infundados. Teve sua garganta cortada em um ataque
covarde e feroz que a surpreendera. Essa foi a primeira de duas atitudes
extremas que aquele rapaz tomou em uma mesma noite.
O pai dele, um homem muito trabalhador, viúvo e neto de japoneses, que
por muitos anos gastou o seu suor, as suas economias e, até mesmo, a herança
da família, subornando policiais e acobertando o mau comportamento de seu
filho, não mais poderia protegê-lo, pois o salto que deu, do quinto andar, o
poupou das acusações recorrentes de fraude em seguros, bem como da prisão
iminente, pelo assassinato da esposa, mas lhe custou muito caro, a própria vida.
A mãe dela, uma senhora amorosa, mas permissiva, no Brasil, logo entraria
em desespero ao descobrir que a sua única filha morrera de forma tão cruel e
trágica. Fazia apenas um mês que a jovem viajara, partindo com a esperança de
construir um futuro financeiramente confortável, não somente para si, mas
[88]