LiteraLivre Vl. 3 - nº 16 – Jul./Ago. de 2019
caducifólios não estavam mais comigo. Se estavam, eu não mais os via, nem
verdes nem calvos. A paisagem opaca dera lugar a um negrume inexaurível. A
solidão e o vazio abrolhavam em minha alma.
Eu bem que avisei que uma hora ele não suportaria sofrer tamanha dor, vendo
murchar sua amada... Mas não havia muito o que ser feito. Todos nos esforçamos
muito para que se sentisse bem, para que ficasse bem, para que vencesse aquele
terrível inverno... Mas ele não aguentou o frio congelante, o qual vive todo ser ao
que parte sua metade. Fez o que fez. Cansado de esperar, como um velho ipê
sofrendo ante a inflorescência, quis ele se antecipar indo logo para a última de
suas primaveras. Eu o vi, quando se trancou em seu quarto... E ouvi, quando
disparou a arma contra a própria cabeça.
A manhã levantava serena quando cheguei à pracinha naquele julho. Havia algo
de novo no ar, eu sabia. Eu finalmente sabia. Respirei fundo sentindo um leve
aroma, misto de brisa e flor. Fiquei tonto, o coração disparou e os olhos foram
clareando... Tudo estava perfeito, pulcro. O canto doce dos pássaros, o chão
forrado de roxo e aquela chuva de flores que não cessava. Fui ficando leve,
virando folha. Suavemente, e sem mais pressa, flutuei ao seu encontro.
Vovô, vivera ainda por alguns anos, desde aquele trágico dia. Durante o tempo
em que passamos juntos, embora apenas vegetasse, em consequência de seu
irrefletido ato, todas as manhãs eu o levava à pracinha em frente, lugar que mais
apreciava quando consciente. Todas as manhãs... Até aquela, quando findara sua
espera.
92