LiteraLivre Vl. 3 - nº 16 – Jul./Ago. de 2019
bairro, inclusive atendendo seu telefone e recusando ir almoçar perante esposa
por dedução. Ninguém cedia, nem mesmo diante novo heterónimo, quando
diálogo suposto com o anterior ficou sem mais assunto até ocasião nova que
necessária pudesse vir a surgir pela frente. Houve quem se apercebeu, não pelo
singular nada comum, mas sim plural mesmo, não só percorrendo rua mas até
nas varandas, parecendo que apostas se levantaram sobre quem iria ceder
primeiro. O cão implorava pelo sair dali, o que levou à maioria estar pelo homem
de pé na rua diante veículo estacionado, não no adoptar de bom senso em
comportamento que esse já tinha desertado havia minutos por sessenta
multiplicados, mas apenas no regresso a casa, deixando o outro dentro do carro
respirar. Mesmo com um pouco de ar entrando pelo vidro aberto num centímetro,
estaria irrespirável por certo, visto lá de cima, num par de varandas onde mais
mirones diziam ou conjecturavam estarem no bom tempo seu por empregue na
melhor das tardes como desde muito não tinham passado. Nem se lembrariam
de tamanha envolvência ali mesmo perante olhos seus de tão pasmados que
estavam. O fim de tarde aproximava-se, o escuro pressentia-se mas «O
coscurioso está prevenido» dito na observação de lanterna acesa no telefone,
parecendo demonstrar ao seu observado refém como não iria sair dali enquanto o
automóvel pela sua frente não ficasse vazio, não importando o quanto lhe
implorasse seu cão ou os telefonemas insistentes de sua esposa, a qual talvez o
vislumbrasse naquelas figuras inimagináveis de antemão, desde o conforto do lar,
ou talvez nem tanto. Escureceu mesmo e não haveria como duvidar que esse
momento chegaria, mas na hora crucial a lanterna falhou, parecendo haver
sorriso triunfante em quem se sentia preso dentro de carro seu. Mas foco de luz
por sorridente alternativa existia em porta-chaves feito candeeiro e parecia que a
noite iria ser longa para desespero de um e envolvência de muitos a acenderem
os candeeiros de suas varandas para perderem simplesmente nada. Nem mesmo
necessidades de canídeo por ali mesmo e até do «Dono da rua» pelas calças
abaixo, parecendo soletrar «Vou resistir até ver quem irá sair do carro e para
onde caminhará ele!» Já não se entendia o que se passava dentro do automóvel,
se estaria a dormir ou a conversar com mais alguém, talvez novo heterónimo,
159