Revista LiteraLivre 16ª edição | Page 152

LiteraLivre Vl. 3 - nº 16 – Jul./Ago. de 2019 Era como se o corredor se alongasse, postergando o que viria a seguir. Num esforço de pesadelos, abro a porta. Na porta, uma figura espectral de olhos incandescentes a dar luz à escuridão. Que em tom gutural diz: — Vim trazer sua Leonora para mais uma noite. — Quem é o senhor?... — Quem sou eu?... Deveria saber. Eu sou Belzebu o Príncipe das Moscas! Ei-la, os lábios vermelhos se contraindo contra os dentes perfeitamente brancos. A pele alva como o um alfenim sob um capuz preto. Dos olhos negros grandes e sérios brotam faíscas que mais parecem brasas. Estranhamente, estão mais vivos do que nunca; não me olham, invadem minha alma. Os cabelos, da mesma cor dos olhos, lhe caem até a metade das costas, lisos. O vestido é o mesmo com que eu a enterrei. Eis meu cadafalso. Já não sei se estou acordado, vivo ou morto. O pensamento pesado de transgressões e remorsos como um navio cargueiro se misturam em minha mente. O peito aos pedaços. Dilacerado. Meu coração é forte, meus ressentimentos é que me doem! Sua rouca e tenebrosa voz uiva dentro dos meus tímpanos: — Se em vida fui para ti um tormento, morrendo eu serei tua morte. — Não chegue perto de mim. – eu grito. Mas ela se aproxima e eu já sinto suas mãos. E a esganadura no meu pescoço. Quando por fim ela cortou minhas forças e embrulhou-me em seu manto. https://www.facebook.com/pauloluis.ferreira.10 149