Revista LiteraLivre 16ª edição | Page 129

LiteraLivre Vl. 3 - nº 16 – Jul./Ago. de 2019 Menosprezo social: a invisibilidade dos moradores de rua Alvorecer Santos Governador Mangabeira/BA Era noite, 22 horas, o céu nublado, e o frio agindo nos corpos jogados ao chão. As pessoas que passavam em frente ao Largo dos Mares, fingiam não ver a realidade que se apresentava aos seus olhos. E aqueles corpos largados ao breu, não lhe causavam sentimento algum, era sinal que o sofrimento alheio já não tinha tanta importância. E a cada dia que se passava, ficava perceptível que a sensibilidade de enxergar o outro estava se perdendo. Como foi anunciado, a chuva não demorou para cair, e cada um dos corpos que ali se encontrava, procurava abrigo em algum lugar, e se refugiava embaixo das marquises, dos viadutos, e nas praças ao redor. O cenário estava repleto de crianças, jovens, adultos e idosos, deixados à própria sorte. Em seus rostos, eram perceptíveis o sofrimento e o desejo em encontrar uma luz no fim do túnel, na esperança daquela realidade mudar. O pior de tudo, era conviver com a incerteza de que acordariam vivos no outro dia. Quando arraiava, tudo voltava a mesma rotina de sempre, os moradores de rua vasculhavam os lixos em busca de alimentos; se prostituíam, usavam drogas, e faziam uns bicos para sobreviver. Assim que os carros paravam na sinaleira, a festa se estabelecia, e um monte de moradores de rua se misturavam em meio aos veículos. E nessa correria, tinham que ser ágeis para limpar os vidros, antes que o sinal abrisse. Depois do serviço, estendiam as mãos, no intuito de arrumar uns trocados para garantir o café da manhã. E assim, passavam o dia sob o sol escaldante. Na pausa para o lanche, quando isso acontecia, se protegiam embaixo das pequenas barracas feitas com pedaços de lençóis velhos, que eram amarrados nos troncos das árvores. Não demorava muito, e em poucos segundos, voltavam 126