Revista LiteraLivre 15ª edição | Page 31

LiteraLivre Vl. 3 - nº 15 – Mai./Jun. de 2019 A mensalidade Guilherme Hernandez Filho Santos/SP Ela não conseguiu identificar, de imediato, aquele som horrível, mas também, vinha de um sono profundo, e aquilo que ouvia era seu despertador tocando, como programado, todos os dias, às sete horas da manhã. Bateu a mão sobre ele, sem nem abrir os olhos. Sabia de cor onde era a tecla soneca que lhe dava mais sete minutos. Repetiu este ato por cinco vezes e aí começou a xingar bem alto, com todas as palavras de baixo calão que conhecia. Sentou-se à beira da cama, colocou seus pés sobre os chinelos, sem calçá- los, apoiou os cotovelos sobre os joelhos, e, com o rosto entre as mãos, ficou estática. Onde estará aquele desgraçado? O sangue subiu em sua cabeça. Pegou o celular e ligou para ele. — Estou aonde venho todos os dias, neste horário, na academia, fazendo ginástica. Ela desatou a chorar. —Você não me ama mais e tenho certeza que estás aí para encontrar tuas “namoradinhas”. Bateu o telefone e soluçou mais um pouco. Virou uma fera. — Se souber de alguma coisa deste pilantra vou capá-lo. Tinha certeza que ele devia estar rindo junto com alguma outra, falando de sua gordura e feiura, conforme se julgava, olhando-se no espelho do banheiro. Atirou a escova de cabelos no chão, depois de desistir de quebrar o espelho com ela. Namoravam havia uns meses e ele dizia que a amava, mas hoje ela tinha acordado com este pressentimento. Ele era lindo, e ela o amava. Começou a chorar novamente. Ela sabia que também era bonita, mas naquele dia se achava horrível. Mas ai dele se aprontasse alguma. Seria a última coisa que faria. Arrastou-se até a sala, abriu o armário e se acalmou comendo meia caixa de bombons “cherry“ da Kopenhagen, que tinha ganhado dele há dois dias. Antes não tinha tido esta fúria, mas agora precisava disso e aí lhe ficou claro o que acontecia. Logo ficaria tudo bem, até o próximo mês. 28