Revista LiteraLivre 15ª edição | Page 86

LiteraLivre Vl. 3 - nº 15 – Mai./Jun. de 2019 Há sete horas tinham se conhecido. Com os guarda-sóis próximos, foi fácil começar uma conversa. De início ele lhe perguntara: — Sabe porque essas águas têm esse tom azul-turquesa? Uma simples pergunta que poderia ter demonstrado pouco interesse. Mas não. Ficou ouvindo com prazer o rapaz explicar sobre a ressurgência e o efeito do reflexo da luz do sol na água. Ele era dali mesmo. Ela, uma turista em seu último dia de viagem. Mais tarde, ele convidou-a a andar até as dunas onde a praia ficava deserta, sem o aglomeramento de pessoas e barraquinhas. — Olha essa como ficou bacana — ele a lembra do presente, mostrando a foto. Guarda a câmera no bolso da bermuda e vira de lado. Estica o braço e com o dedo indicador desliza lentamente pela testa dela, nariz e lábios, desenhando seu perfil no ar. Ela sente um leve tremor por dentro. Sorri. Ele pega seu rosto, virando-o para ele. Beijam-se demoradamente e então, sem que nenhuma palavra fosse necessária, desaguam seus anseios num canto do fundo infinito da praia, como se há muito se conhecessem e se amassem. Em meio ao revoar incessante, afundam-se na areia macia, buscando, entre os grãos, a paz perdida e brevemente reencontrada. Ficam longos minutos deitados lado a lado com as pernas entrelaçadas, ela com a mão pousada no peito dele. Em seguida ele a puxa e vão para o mar. Brincam como crianças sem se importarem com o céu prestes a cair no mar, a areia escoando pela ampulheta e tampouco com a tarde que vai sumindo num dia de verão. Ao se despedirem, ela comenta o quão pouco sabem um do outro. — Melhor assim. As histórias que não contamos são as mais interessantes — ele respondeu. Abraçam-se no último beijo. Nada mais a dizer, nenhuma promessa a cumprir. Porém, muito o que lembrar e nenhum pesar por se arrepender. No olhar que trocam, a despedida inadiável. Nas pegadas na areia, os caminhos opostos de cada um. Ao deixar a cidade, ela não somente dava adeus àquele lugar, mas também a um amor consumado na areia fina e compartilhado com as gaivotas. Em seu último olhar para a praia, pareceu-lhe vê-la ainda mais bela sob a primeira luz da manhã dourando a areia molhada. Fecha os olhos pensando nas dunas. Somente elas sabem, somente elas viram que o amor fora seu apenas por algumas horas, algo que, na verdade, já pertencia àquela praia e seu mar azul-turquesa, muito antes de se encontrarem. E ali permaneceria. https://www.facebook.com/conversadaboa/ 83