Revista LiteraLivre 15ª edição | Page 76

LiteraLivre Vl. 3 - nº 15 – Mai./Jun. de 2019 Passou por vários príncipes que viraram sapos, trasgos, medusas, íncubos, os quais, por um tempo, conseguiram transformá-la em um monstro trancafiado na torre da amargura e indiferença. Distante de todos, até dela mesma. Brigando com os problemas e aflições amorosas, um dia encontrou uma outra princesa dos tempos de escola, a qual estava na fila para ingressar na grande carruagem metálica, apelidada carinhosamente de ônibus. Na cabeça, vieram as lembranças empoeiradas da colega de classe, uma das garotas rotuladas como “popular”. Lembrava daquela moça de curvas atraentes e riso fácil, cujos cabelos balançavam pra lá e pra cá no ritmo da vontade do vento. De repente, a mulher, que não mais se assemelha com aquela garota, vira para cumprimentá-la, o rosto não só está desgastado pelo tempo, mas arroxeado. O sorriso, antes tão branco, estava incompleto e desgastado. O corpo antes tão jovial tornou-se um pergaminho dos maus tratos, naquele momento, contou que estava fugindo para tentar viver. A colega, agora de curvas cansadas, era a introdução ao apodrecimento do mundo. E depois dessa princesa, outras princesas contaram o que acontecia depois do fim do conto de fadas: tapas no rosto, socos (algumas voltavam recorrentemente na esperança de ser “só esta vez”), estupros, tentativas de suicídio, passadas de mão (no ônibus, na rua, seja criativo(a) em imaginar os lugares), abuso de professores, chefes, colegas de trabalho, desrespeitos psicológicos, nomes pejorativos por praticar a mesma conduta que o sexo oposto, fotos expostas para o público e todas na espera constante para saber quem será a próxima a entrar na estatística do extermínio de uma princesa a cada duas horas. Hoje em dia, a menina do começo da história é uma mulher de cabelos comportados e um pouco brancos, minguada e acrimoniosa, vive e ouve o que a mãe disse. Entendeu que a bruxa não era uma bruxa, mas sim, uma mulher 73