Revista LiteraLivre 12ª edição | Page 137

LiteraLivre Vl. 2 - nº 12 – Nov./Dez. de 2018 Pelo Menos Rodrigo Duhau Brasília/DF Nas mãos daquele homem alto, negro e de fria expressão, um metal afiado, que poderia deslizar por peles aveludadas, fazendo sulcos de sangue. Era um sublime utensílio para a consumação de um sem-número de torturas, principalmente se o agressor fosse hediondo e criativo. A adolescente acabara de completar dezesseis anos. Era uma menina morena clara, longilínea, sua boca possuía lábios harmoniosos. Ostentava cabelos lisos e aloirados que por questão de pouquíssimos centímetros não tocavam sua cintura. Ela estava sentada, imóvel. Seus olhos castanhos claros mantinham-se fechados. E o homem com o cortante objeto se aproximava daquele corpo ainda virgem. A garota tentou se preservar forte, intransponível, mas não resistiu e deixou uma lágrima umidificar o lado direito de seu rosto que tinha formato de coração. As mãos da jovem pressionavam intensamente os braços da cadeira toda vez que o homem escorregava seus grossos dedos pelos cabelos dela. Ela sentiu a respiração dele, pois, naquele momento, o homem estava próximo ao seu gracioso pescoço. Isso a arrepiou, mas a excitação estava embebida de nervosismo e de medo. – Importa-se se eu continuar? – indagou o homem. – Não – disse, laconicamente, a menina. – Sabia que tinha vindo aqui para isso – sentenciou ele. – É dolorido, mas não recuarei. A tesoura do negro e talentoso cabeleireiro meneava freneticamente pelos longos e aloirados cabelos da jovem. Os fios dourados daquela caridosa menina se destinariam a mulheres que, ao passarem por quimioterapia contra o câncer de mama, perderam seus cachos, mas não a vontade de viver. www.facebook.com/rodrigoduhau 131