LiteraLivre Vl. 2 - nº 11 – Set/Out. de 2018
Mesmo o escaldante sol parecia me perfilar em reprovação quando ao
escavar encontrei aquela porta de pedras verdes. Por qual motivo o luxo
suplantaria o medo? Que achado, eu pensei, ao tocar aquela formidável estrutura
reerguida com afinco pelos antigos, pois aquela cripta era também seu templo
por causa de um terror que de tão medonho gerava respeito aos incautos que
não quisessem fulminarem no enfado e infarto do medo.
A medida que tirava a terra que encobria a porta que estava inclinada a 45
graus, desvelava-se inscrições em sumério que antecediam mesmo Dante
Alighieri em seu bizarro pedido para que os que lá adentrassem abandonassem
toda fé e esperança. Mas como fui ignorante em negar tais avisos!
A sua volta, nas laterais da porta, duas grandes gárgulas enigmáticas
pareciam proteger suas entradas como Guardiões do Hades, tal como Cerberus
no inferno e Miguel nos céus. Como tolo fui em considerar isso como relés mitos
o qual as afirmações esparsas no tempo remetiam as desculpas dos cleros para a
conversão de cristãos. Soube da pior forma tardia que não!
O caminho dos curiosos, o caminho dos vãos prazeres e desejos
moralmente senis, que levavam apenas a seu oposto, mas este tortuoso caminho
se apresenta de muitas formas para muitas formas de pessoas, ai dos que virão
atrás de mim, antes o Estado Islâmico detone aqui bombas!
Mesmo meu ajudante se recusou falar em minha língua, sua recusa em
prosseguir. Mas de bruços deitei-me para que livremente me rastejasse pelas
entranhas da terra até o inferno onde o calor não era o amor, mas o que ardia
nossos pecados.
O escuro precedia as chamas trêmulas das dores alimentadas com as
almas dos condenados, mas faminto como era aquele que lá reina queria mais e
mais, não somente tragar almas, mas expandir seus territórios fazendo encima
como embaixo.
Tão logo ao acender as luzes da lanterna como fiapo de resistência da
esperança, o torpor de odor bolorento me sobreveio como anestesia aos meus
sentidos. Tão logo aquela mescla de amônia com enxofre parecia prenunciar
improváveis atividades sísmicas na região pois lá não dormia um vulcão.
O medo há de manifestar em todos os sentidos, assim pensei ao ouvir ecos
de um grande espaço em seu interior. A medida que avancei agora engatinhando
esses sons pareciam remeter o murmúrio de arrependimento de suas vítimas.
São muitas línguas, poucas delas identifiquei, como se ali fossem as
fundações da antiga Babel. Mas então um gemido que parecia conter toda dor e
prazer do mundo ecoou sentenciosamente silenciando as demais ao dizer num
agourento latim: Periit omni tempore futuro animarum locis.
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