Revista LiteraLivre 11ª Edição | Page 172

LiteraLivre Vl . 2 - n º 11 – Set / Out . de 2018

Uma Noite em Macau

David Leite Jandira / SP
Após a separação , cheia de querelas , discussões , acusações e litígios , tudo o que era seu cabia em uma mala . Apenas uma mala . Pouco de valor restava ali dentro , apenas o frugal . Apenas o necessário para um acampamento ou para uma viagem sem volta . Não tinha dinheiro suficiente no banco para recomeçar uma vida . Nenhuma posse lhe restou . Nada . A enxurrada levou . A enxurrada com gravata e terno Dior . Nada , além da roupa do corpo e itens frugais ficou em seu poder . Tudo o que construiu em vida era para aquele casamento , e tudo ficou para aquele casamento , que dia a dia se distanciava de si . A porta fechada pela última vez ficava menor com à distância de seu prosseguir , e o horizonte parecia demais aberto como uma boca de baleia que iria engolir seu futuro . Desnorteado a respeito do que fazer depois , decide arrastar sua vida naquela mala para algum lugar onde pudesse tentar a sorte , que não lhe sorriu muito nos últimos anos . Talvez fosse esse o destino dele , um pobre diabo que apostaria com a vida . Entre as cegas diante de um atlas , aponta o dedo para um lugar qualquer . Para onde ir em desrumo . Tão frustrado com tudo estava que sequer temeu uma última traição de seu próprio artelho , o dirigindo para piores acasos . Seu fiel apontador caiu sobre Macau . A Sino-Vegas , a cidade onde se deleita com o exótico oriental emoldurando o seio ocidental . Ali era um ótimo lugar para , não recomeçar sua vida , mas por cabo dela . Com uma dose de luxúria exótica . Jamais em tempos de marido responsável imaginava visitar a cidade . Mas , nesse momento , despojado de tudo , não via outro brilho no horizonte mais satisfatório . Arruma as malas e compra uma passagem . Estaria ali em poucos dias . Dentro de tuas economias , só conseguiu o pior lugar de um cruzeiro . Na pequena cabine para dois , uma ripa de madeira engastada na parede de ferro como uma prateleira servia de cama . Teve , ao menos , a sorte de não ter companheiro naquela viagem . Esperava estar só . O balançar do navio tinha especial efeito na cabine abaixo de tudo no casco , que era o que pôde conseguir com as parcas economias . Seu estômago vibrava tanto quanto o mar , mas , sem nada o que digerir também não se incomodou em expelir algo . Quatro dias de viagem e um quinto parado no porto de Cotai até finalmente liberarem os passageiros .
166