Revista de Medicina Desportiva Setembro 2020 Setembro 2020 | Page 9

Benefícios e riscos da prática de exercício físico durante a gravidez e no puerpério Devido ao seu importante papel na manutenção de um estilo de vida saudável , a atividade física tem recebido mais atenção nas últimas décadas , até pelo aumento da taxa de obesidade a nível mundial . As mulheres obesas têm risco maior de desenvolver diabetes gestacional e maior probabilidade de ganho excessivo de peso gestacional , podendo afetar significativamente a saúde materna e fetal . A atividade física durante a gravidez não diminui apenas o risco de diabetes gestacional 10-14 , mas também reduz a probabilidade de desenvolvimento de pré- -eclâmpsia e de hipertensão arterial induzida pela gravidez , diminui o risco de cesariana e a gravidade dos sintomas depressivos pré-natais . 5 , 4 , 15 O exercício pré-natal pode ainda reduzir a duração do segundo estádio do trabalho de parto 16 , 17 , assim como diminuir o risco de cesariana ou instrumentalização de parto vaginal . Estudos recentes mostram ainda que poderá diminuir a probabilidade e a gravidade dos sintomas de incontinência urinária pré e pós-natal em mulheres continentes antes da gravidez . 18
Existe uma preocupação teórica de que o exercício possa influenciar negativamente o desenvolvimento fetal , apesar de a evidência sublinhar efeitos positivos do exercício pré-natal nos recém-nascidos : o exercício de baixa intensidade no início da gravidez aumenta o fluxo sanguíneo umbilical e pode melhorar a circulação placentária 9 , 19 ; otimiza a velocidade do crescimento fetal e desenvolvimento neuronal e reduz potencialmente a percentagem de gordura fetal . 10 Além disso , mulheres fisicamente ativas possuem menor risco de ter bebés macrossómicos ( peso ao nascimento > 4000g ) 19 , associado sobretudo a maior taxa de complicações obstétricas , como lesão do plexo braquial , fratura clavicular ou distócia de ombros no neonato . 20
É interessante observar que quando se tentou estabelecer uma relação de dose-resposta entre atividade física e outcomes favoráveis na gravidez , mais atividade física ( frequência , intensidade , duração e volume ) foi associada a maiores benefícios em saúde , nomeadamente redução do risco de desenvolvimento de pré-eclâmpsia , diabetes gestacional , hipertensão gestacional e diminuição dos sintomas depressivos . 12 , 15 , 21 No entanto , um limite superior de prática de exercício físico não foi estabelecido . 5
Numa abrangente revisão sistemática e metanálise de 135 estudos , a atividade física materna não esteve significativamente associada ao parto pré-termo , baixo peso ao nascimento (< 2500g ), restrição de crescimento intrauterino , hipoglicemia neonatal , acidose metabólica ( pH do sangue do cordão umbilical ), hiperbilirrubinemia ou baixos scores de Apgar . 5 , 21
Além disso , o exercício regular praticado num total de até sete horas semanais ( incluindo treino aeróbio de baixa e corrida , ciclismo e natação ) não se associou a aumento da taxa de aborto espontâneo no primeiro e até metade do segundo trimestres , como denota um estudo prospetivo de coorte com 90.270 mulheres dinamarquesas , o qual comparou a duração do exercício e as taxas de aborto em quatro fases da gestação , não identificando aumento significativo no risco de aborto relacionado com o exercício . 22
Recomendações gerais de prescrição de exercício físico na grávida 5
Todas as mulheres sem contraindicações devem ser fisicamente ativas durante a gravidez . Esta recomendação inclui mulheres previamente inativas , mulheres com diagnóstico de diabetes mellitus gestacional e mulheres com sobrepeso ou obesas ( índice de massa corporal pré-gestacional ≥25kg / m 2 ). 5
A grávida deve acumular pelo menos 150 minutos de atividade física de intensidade moderada a cada semana para obter uma redução clinicamente significativa das complicações relacionadas com gravidez , devendo esta ser acumulada durante um mínimo de três dias por semana , embora seja encorajada a atividade física diária . Devem ser incorporados exercícios aeróbios e treino de resistência e poderá ser interessante conjugar atividades de alongamento , como yoga ou Pilates ( à exceção do hotyoga pelo risco de hipertermia ). A evidência disponível indica que o tipo de exercício mais benéfico em relação aos ganhos em saúde materno-fetal é aquele que combina o treino aeróbio e de resistência ( força ), por otimizar a capacidade cardiorrespiratória da grávida e diminuir a probabilidade de desenvolvimento de incontinência urinária . 17
A prescrição de exercício na gravidez deve pressupor uma abordagem individualizada e consider as características particulares de cada mulher . A frequência , intensidade , tipo e duração do treino devem ser descritas de acordo com o estado de atividade física anterior à gravidez . 19 Existem atualmente ferramentas
Tabela 1 – Contraindicações à prática de exercício físico na gravidez 5
Absolutas
Rutura de membranas ou trabalho de parto pré-termo ( gravidez anterior )
Hemorragia vaginal persistente sem causa estabelecida
Placenta prévia após a 28 ª semana de gestação
Pré-eclâmpsia
Colo do útero incompetente Restrição de crescimento intrauterino Gravidez múltipla ( mais de 2 fetos )
Diabetes tipo I , hipertensão arterial ou doença tiroideia não controladas
Outras doenças do foro cardiovascular , respiratório ou sistémico graves
Relativas
Aborto espontâneo recorrente ou de repetição
Hipertensão gestacional
História de parto pré-termo espontâneo
Doença cardiovascular ou respiratória ligeira / moderada
Anemia sintomática Desnutrição Distúrbio alimentar
Gravidez gemelar após a 28 ª semana de gestação
Revista de Medicina Desportiva informa setembro2020 7