Revista de Medicina Desportiva Novembro 2020 Novembro 2020 | Page 13

Praticar exercício físico em ambiente frio

Dossier

Rev . Medicina Desportiva informa , 2020 ; 11 ( 6 ): 11-21 https :// doi . org / 10.23911 / Dossier _ frio _ 2020 _ nov

Praticar exercício físico em ambiente frio

Introdução
Dr . Basil Ribeiro Medicina Desportiva . Al Nassr F C , Riade , KSA
A prática de exercício físico em condições atmosféricas adversas ( excesso de calor ou de frio , de vento ou de humidade , sob chuva ) exige do corpo humano adaptações permanentes no sentido de manter a homeostasia interna e o rendimento desportivo desejado . O desafio ao corpo humano aumenta ainda com a altitude muito elevada e no que se refere ao ambiente frio é diferente se desporto é praticado dentro ou fora de água . A exposição solar , o vestuário e a taxa metabólica são outros fatores que poderão interferir no aquecimento ou no arrefecimento excessivos . 1
Em ambiente frio , a perda de calor por convecção é determinante para a hipotermia e queimadura pelo frio , que será maior na natação e proporcional à velocidade de nado e à diferença de temperaturas , pelo que a natação em águas abertas merece atenção especial . 1 A Federação Internacional de Natação só permite a prova se a temperatura for superior a 16 ° C , medida a 1m de profundidade . Desde 2017 obriga ao uso de fatos de mergulho com temperatura da água inferior a 18 ° C e ao uso opcional se inferior a 20 ° C . 2
No sentido de se avaliar a temperatura mínima da água para a prática de maratonas de natação , 12 nadadores de competição foram instruídos para nadaram com touca e calção , durante duas horas , em águas cuja temperatura variou entre 14 e 20 ° C . A temperatura retal , a perceção ao esforço e o rendimento foram medidos . Com a água a 16 ° C , seis nadadores não terminaram a prova
( 4 ficaram ou previa-se que ficassem com hipotermia ) e a 18 ° C quatro não terminaram , dos quais três ficaram ou previa-se que ficassem com hipotermia . Os autores concluíram que as temperaturas da água igual a 16 e a 18 ° C são demasiado baixas para a prática daquele tipo de provas . 2
Para além do risco de hipotermia , a imersão em água fria , assim como a apneia , desencadearam reflexo autonómico , de que resultou bradicardia , ao passo que a imersão em água termo neutra não causou ( p < 0.01 e 0.002 , respetivamente ), e a aplicação simultânea dos dois estímulos teve efeito cumulativo . 3
Fora de água , o vento favorece a perda de calor por convecção , mas também o vestuário excessivo poderá provocar sudorese abundante , perdendo-se depois calor na evaporação desse suor . A quantidade de roupa e capacidade de reflexão do vento da peça exterior são fundamentais para a prevenção da hipotermia . 1 A inalação do ar frio , para além de eventuais problemas respiratórios , causará arrefecimento adicional , pelo que em ambientes muito frios se aconselha a colocação de um lenço ou outra peça sobre a boca e nariz . O vestuário molhado que acontece quando o desporto é praticado sob chuva , habitualmente ela própria fria , favorece a convecção e a perda de calor . 1 , 4 , 5 Com velocidade elevada , como acontece no ciclismo , o risco de hipotermia é elevado , agravado pelo deficiente equipamento protetor .
Curiosamente , em desportos de inverno , poderá ser o staff de apoio o de maior risco para hipotermia , pois permanece durante bastante tempo , horas , a assistir e a dar apoio aos atletas , ao passo que estes realizam provas de curta duração , quase todas de duração inferior a três minutos , e com intensidade metabólica elevada , pelo que com elevada produção de calor interno . 1
A permanência em pé de sete jovens saudáveis , durante 20 minutos , 1 ) sem chuva e sem vento , 2 ) expostos ao vento ( 3 m / s ) e 3 ) expostos ao vento ( 3 m / s ) e à chuva ( 40 mm / h ) teve maior perda de calor em 3 ) comparado com as outras duas situações de análise ( p < 0,01 ), com temperatura cutânea significativamente inferior . 4 Foi realizado um estudo com 12 atletas ( 21.7 ± 3.3 anos de idade ; estatura = 1.76 ± 0.08 m ; peso corporal : 68.8 ± 7.1 kg ;
VO 2 max = 67.3 ± 5.0 mL / kg / min ), em tapete rolante ( intensidade = 80 % do
VO 2 max ), durante 60 minutos , com chuva e sem chuva , num ambiente frio ( 5 ° C ). 5 A temperatura retal , medida aos 10 , 40 , 50 e 60 minutos de prova , assim como a temperatura média cutânea , foram inferiores na prova sob chuva p < 0,05 ). O VO 2 e a perceção do esforço foram também superiores aos 50 e 60 minutos em relação à condição sem chuva . Os autores referem ainda que com o evoluir das provas a perda de calor intensificou-se devido à cada vez maior área molhada . 5
O inverno aproxima-se , será frio e chuvoso , há prática de exercício físico e de desporto no exterior , o risco de hipotermia poderá ocorrer , especialmente nos amantes de desporto na neve , mas também nos que molhados e frios insistem em terminar o treino ou a competição . As consequências médicas negativas a nível respiratório e cardíaco poderão ocorrer , pelo que importa estar atento , assim como orientar as crianças e adolescentes nestes ambientes potencialmente adversos . Perceber a reação fisiológica do organismo ao frio e a utilização adequada do vestuário são elementos importantes para a prevenção da hipotermia .
Bibliografia
1 . MF Bergeron et al . International Olympic Committee consensus statement on thermoregulatory and altitude challenges for high- -level athletes . 2012 Sep ; 46 ( 11 ): 770-9 . Doi : 10.1136 / bjsports-2012-091296
2 . Jane Saycell et al . How cold is too cold ? Establishing the minimum water temperature limits for marathon swim racing . Br J Sports Med . 2019 Sep ; 53 ( 17 ): 1078-1084 . doi : 10.1136 / bjsports-2018-099978 .
3 . N Marsh et al . Relative contributions of voluntary apnea , exposure to cold and face immersion in water to diving bradycardia in humans . Clin Exp Pharmacol Physiol . 1995 Nov ; 22 ( 11 ): 886-7 . doi : 10.1111 / j . 1440-1681.1995 . tb01957 . x .
4 . Motoi Yamane et al . Effects of wind and rain on thermal responses of humans in a mildly cold environment . Eur J Appl Physiol . 2010 May ; 109 ( 1 ): 117-23 . doi : 10.1007 / s00421-010-1369-y .
5 . Ryo Ito et al . Rain exacerbates cold and metabolic strain during high-intensity running . Sports Med Phys Fitness . 2019 Oct ; 59 ( 10 ): 1601-1607 . doi : 10.23736 / S0022- 4707.19.09865-7 .
Revista de Medicina Desportiva informa novembro 2020 · 11