Revista de Medicina Desportiva Nov. 2021 | Page 5

Rev . Medicina Desportiva informa , 2021 ; 12 ( 6 ): 3-4 . https :// doi . org / 10.23911 / FMUP _ 2021 _ nov
Dra . Inês Pinto de Sousa 1 , Dr . Rui Lopes Madureira 2
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Médica interna de formação específica em Medicina Geral e Familiar na USF Covelo , ACeS Porto Oriental ; 2 Médico interno de formação específica em Medicina Física e Reabilitação no Centro Hospitalar e Universitário do Algarve .
Resumo / comentário
The Effects of Menstrual Cycle Phase on Elite Athlete Performance : A Critical and Systematic Review 1
A participação feminina em eventos desportivos tem aumentado progressivamente , em paralelo com a qualidade da sua prestação . A investigação no âmbito da performance desportiva tem também crescido ao longo do tempo . Porém , as mulheres representam apenas 35 % dos atletas estudados . A frequente exclusão das atletas femininas destes estudos pode ser justificada com base em diversos fatores confundidores , incluindo as variações hormonais durante o ciclo menstrual ( CM ), que podem ter impacto na performance desportiva .
O CM inicia-se no 1 º dia da menstruação e pode ser dividido em quatro fases : fase menstrual ( FM ), fase folicular ( FF ), fase ovulatória ( FO ) e fase lútea ( FL ). Ele é regulado pela interação de diversas hormonas , designadamente estrogénio , progesterona , hormona folículo- -estimulante ( FSH ) e hormona lúteo-estimulante ( LH ). Pequenas variações no equilíbrio destas podem levar a diversos sintomas , como dor , aumento ponderal , perturbações do sono e alterações do humor . Para além da função reprodutiva , as hormonas sexuais são responsáveis por alterações a nível cardiovascular
e muscular , por funções termorreguladoras e por respostas metabólicas a diversos estímulos . O estrogénio promove a vasodilatação endotélio- -dependente e , quando os seus níveis estão baixos , aumento da resposta cardiovascular ao stress . A progesterona tem um efeito termogénico central , atuando a nível do hipotálamo .
Vários autores estabeleceram uma lista de componentes da performance desportiva que poderiam ser afetados pelas alterações provocadas pelo CM . Estes efeitos são altamente dependentes da fisiologia das atletas , do nível de treino e do tipo de contraceção hormonal utilizado . Porém , as variações hormonais ainda não são consideradas na individualização dos treinos das mulheres . Diversos estudos demonstraram a influência do CM na performance de atletas , mas não em atletas de elite .
Esta revisão sistemática incluiu estudos cuja população são atletas de elite , consideradas aquelas que frequentam competições a nível nacional ou internacional , e onde foi estudado o efeito das várias fases do CM na performance . O principal objetivo foi verificar se existe consenso que permita recomendar , com base na evidência , um treino individualizado de acordo com a fase do CM . Trata-se de uma revisão sistemática de qualidade , cumprindo os critérios propostos nas guidelines PRISMA . 2
Foram incluídos sete estudos , com um total de 314 atletas . Os desportos incluídos foram diversos ( triatlo , natação , judo , taekwondo , voleibol , andebol , futebol , râguebi e netball ). Todos os estudos avaliaram os níveis hormonais em pelo menos três CM . Quatro estudos basearam-se em resultados objetivos a nível físico e de performance . Seis estudos identificaram uma variação na performance entre a FL e a FF . Um estudo verificou redução significativa da resistência na FL em jogadoras de futebol . Por sua vez , não se verificou um impacto significativo da fase do CM na capacidade de salto ou sprint .
Quanto às lesões , as ruturas do ligamento cruzado anterior foram mais frequentes nas semanas anteriores ou logo após o início da menstruação em jogadoras de andebol . Os dados corroboram estudos anteriores , onde se verificou a relação entre os níveis e a laxidão da articulação do joelho com diminuição da sua rigidez durante a FO .
Relativamente às alterações do comportamento , a impulsividade foi significativamente influenciada pelo CM , sendo maior durante a FM . Foi demonstrado que o desejo competitivo e a motivação para o treino eram maiores durante a FO . Através de questionários , as atletas referiram que se sentiam melhor nos primeiros 14 dias de ciclo , comparativamente com a 2 ª metade do mesmo . A maioria referiu que sentia dores durante a FM , que melhoravam quando em competição , e que a sua performance desportiva não era influenciada pelo período menstrual .
Em suma , os estudos existentes são escassos e é reduzido o número de conclusões que se podem tirar relativamente aos aspetos da performance desportiva que podem ser influenciados pelas variações hormonais . Apesar de ser um aspeto interessante a considerar no treino individualizado desta população , ainda não é possível fornecer recomendações com base na evidência .
Os autores concluem que a performance parece permanecer estável ao longo do CM , não sendo clara a existência de uma fase ótima de desempenho , pelo que são necessários mais estudos sobre o tema com vista à formulação de conclusões sólidas sobre o impacto do CM nas atletas de elite . Na opinião dos autores , uma melhor compreensão da relação entre CM e adaptação ao treino poderia levar a uma importante vantagem na performance das atletas de elite .
Apesar do CM potencialmente influenciar diversos aspetos fisiológicos e psicológicos , este ainda não é considerado de igual forma comparativamente com outros determinantes fisiológicos na performance desportiva . Esta lacuna pode ser explicada por vários fatores , nomeadamente a falta de investigação , conforme já referido , o facto destas variações serem dependentes das experiências individuais das atletas e o desconforto sentido por muitas
Revista de Medicina Desportiva informa novembro 2021 · 3