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Existem diferentes técnicas de treino , conduzindo cada uma delas a benefícios específicos , sendo que o seu objetivo é ajudar o atleta a aumentar o seu desempenho com recurso à técnica mais apropriada .
Treino específico / alertas
A deficiência implica uma necessidade de atenção especial ao treino . O médico fisiatra é fundamental neste contexto e assume ainda um papel crucial no processo de classificação destes atletas .
No meio clínico perpetuam-se conceitos errados , como o da prática de desporto no atleta com deficiência ser prejudicial , o que limita a sua participação . É da responsabilidade médica a avaliação objetiva do risco da prática desportiva numa relação risco / benefício . Para tal são necessários conhecimentos sobre a deficiência .
O atleta com deficiência apresenta um risco de lesão igual ao atleta “ fisicamente capaz ”. No entanto , quando há lesão neste tipo de doente , poderá apresentar maior gravidade . Alguns fatores que podem justificar esse fenómeno incluem os longos períodos afastado da prática de atividade desportiva , treino inadequado e falta de acesso a apoio clínico / médico . 3
A tabela 2 resume as principais particularidades associadas a estes doentes .
Disreflexia autonómica
Esta síndrome corresponde a uma descarga simpática sem controlo , frequentemente encontrada em
LVM altos ( acima de T6 ). Tem origem num estímulo nóxico abaixo do nível lesional , que pode originar uma ativação súbita do sistema nervoso simpático devido a perda da modulação da resposta autonómica para estímulos periféricos , resultando numa síndrome clínica caracterizada por hipertensão , alterações do ritmo cardíaco , rubor e piloereção . 5 O termo impulso teve origem no ano de 1993 em atletas tetraplégicos em cadeira de rodas para descrever uma autoindução de episódios de disreflexia autonómica com o intuito de aumentar a performance . O mecanismo usado para induzir disreflexia envolvia a distensão vesical por ingestão de grandes volumes de líquidos antes da competição . Neste âmbito , os estudos de Burnham demonstraram vantagens neste método , nomeadamente a diminuição do tempo de corrida em 9,7 % e aumento do consumo de oxigénio ( VO 2
) associado a aumento da tensão arterial . 3-6 Atualmente , esta prática é considerada dopagem pelo Comité Olímpico Científico da Federação Internacional de Desporto em Cadeira de Rodas devido à vantagem desportiva conferida aos atletas e pelas graves consequências de saúde associadas . 5
Alterações da termorregulação
A intolerância ao calor deve-se a múltiplos fatores , entre os quais a diminuição do estado de consciência , a deficiência do sistema nervoso simpático ( SNS ) e o mecanismo corporal deficiente para aquecimento e arrefecimento . Estas alterações afetam sobretudo atletas com LVM , particularmente lesões altas ( acima
Tabela 2 – Particularidades médicas associadas a diferentes condições clínicas
Condição Clínica LVM
Amputados
Síndrome de Down
Deficiência visual
Particularidades a considerar
· Disreflexia autonómica
· Alterações da termorregulação
· Espasticidade
· Alterações cutâneas
· Risco de queda
· Instabilidade atlantoaxial
· Pé plano
· Instabilidade patelar
· Risco de queda
· Fadiga precoce
Utilizadores de cadeira de rodas · Lesões dos membros superiores (++ ombro )
· Fraturas
· Queimaduras por fricção de T8 ), mas também outras deficiências , como paralisia cerebral ( PC ) e síndrome de Down .
Os anticolinérgicos , frequentemente usados nestes atletas , aumentam a vulneralidade a alterações da termorregulação , nomeadamente aumentam o risco de hipertermia . Adicionalmente , é fulcral prestar atenção à desidratação em atletas com alterações na deglutição . Entre as formas de prevenção incluem-se promover espaços com sombra , usar roupas claras , chapéus e prender garrafas de água em cadeiras de roda durante o treino . Nos Jogos Paralímpicos de 1996 , em Atlanta , devido ao forte calor registado , os atletas foram instruídos a hidratarem-se a cada 10-15 minutos para evitarem complicações associadas às alterações da termorregulação . 7
Convulsões
Em 1996 , o Comité Oficial da American Medical Association recomendou impedimento da prática de futebol , trilhos e ténis em atletas com crises convulsivas . A base desta decisão seria a de que o stress associado ao esforço aumentaria o risco convulsivo pelo aumento da produção de adrenalina , hipoglicemia , hipóxia , desidratação , desequilíbrio hidroeletrolítico e hiperventilação que lhe estão associados .
Todavia , a hipoglicemia , a desidratação e o desequilíbrio hidroeletrolítico são evitáveis com a ingestão nutricional e líquida apropriada . Relativamente à hiperventilação não se provou empiricamente que estivesse associada a crises convulsivas durante a prática desportiva . Nesse sentido , a evidência atual mostra que os atletas sofrem menos crises convulsivas durante o exercício . No entanto , é de realçar a importância da atenção à medicação anticonvulsivante , que pode diminuir a atenção e ter impacto negativo no desempenho do atleta . 8
Medicação para controlo da patologia de base
É comum no atleta com deficiência o uso de medicamentos para a asma , crises convulsivas , hiperatividade ,
Revista de Medicina Desportiva informa março 2022 · 21