Revista de Medicina Desportiva Julho 2020 - Page 9
Caso clínico
Rev. Medicina Desportiva informa, 2020; 11(4):7-9.
https://doi.org/10.23911/CC_luxa_esternoclavic_2020_julho
Um Caso de Luxação
Esternoclavicular em
Praticante de Jiu Jitsu
Dra. Catarina Neto Pereira 1 , Dr. Fábio Sousa 1 , Dr. João Castro 1 , Dra. Mafalda Lopes 2 , Dr. Fernando Amaral 2
1
Interno de formação específica; 2 Assistente Hospitalar; 3 Assistente Hospitalar Graduado. Serviço de
Ortopedia, Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca. Amadora.
RESUMO / ABSTRACT
As lesões na articulação esternoclavicular são raras, podendo ameaçar a vida quando
incorretamente diagnosticadas. A luxação posterior desta articulação associa-se a múltiplas
complicações, como lesões na traqueia ou trauma de grandes vasos. O diagnóstico
radiográfico é difícil. O tratamento da luxação posterior desta articulação pode ser
conservador ou cirúrgico. Neste caso clínico pretende-se descrever o caso de uma luxação
posterior da articulação esternoclavicular em praticante de Jiu Jistsu e ilustrar questões
associadas ao seu diagnóstico e tratamento.
Injury to the sternoclavicular joint is uncommon but may be life-threatening if the diagnosis is
missed. Posterior sternoclavicular joint dislocation is associated with multiple complications like
tracheal tear or trauma to the great vessels. Diagnosis by conventional radiography is difficult.
Treatment of posterior sternoclavicular joint dislocation can be either conservative or surgical. The
purpose of this case report is to describe a posterior sternoclavicular joint dislocation in a Jiu Jitsu
fighter and to illustrate the issues associated with its diagnosis and treatment.
PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDS
Luxação esternoclavicular, redução articular, Jiu Jitsu
Sternoclavicular dislocation, joint reduction, Jiu Jitsu
Introdução
Primeiramente descrita por Sir
Astley Cooper em 1824, a luxação
posterior da articulação esternoclavicular
(Figura 1) é rara e corresponde
a menos de 1% de todas as
luxações. 1,2 Esta lesão pode ser provocada
por trauma direto ou, sobretudo,
por trauma indireto através de
forças aplicadas na região póstero-
-lateral do ombro. 3 Esta lesão ocorre
mais frequentemente no contexto
de acidentes de viação, mas estão
descritos casos ocorridos na prática
de desportos de impacto, como o
râguebi. 4 Devido à sua localização
próxima do mediastino, a luxação
posterior desta articulação está
associada a múltiplas complicações,
incluindo compromisso respiratório,
lesão vascular, compressão do
esófago, plexopatia braquial e até
morte. 5
Clinicamente os doentes apresentam-se
com dor significativa,
potencialmente associada a congestão
venosa, dispneia e disfagia. O
bordo medial da clavícula encontra-
-se luxado posteriormente, sendo
que o contorno do esterno é exposto
à palpação. São necessários exames
complementares para estabelecer o
diagnóstico, uma vez que a clínica é
muitas vezes equivoca. 6 A tomografia
computorizada (TC) é o exame de
eleição para este diagnostico, uma
vez que a radiografia convencional
tem baixa sensibilidade. 6,7 O tratamento
pode ser conservador (redução
fechada) ou cirúrgico (redução
aberta com ou sem reconstrução
cirúrgica da articulação esternoclavicular).
3,4
O objetivo deste artigo é descrever
um caso de luxação posterior da
articulação esternoclavicular em
praticante de Jiu Jitsu e ilustrar as
questões relacionadas com o diagnóstico,
tratamento e o recomeço da
atividade desportiva do praticante.
Caso clínico
Figura 1 – Luxação posterior da articulação esternoclavicular
direita (R) 3
Doente do sexo masculino, 24 anos
de idade, admitido no Serviço de
Urgência após trauma direto na
região anterior do tórax durante
treino de Jiu jitsu. À chegada apresentava-se
consciente e orientado
(Score de Glasgow 15), hemodinamicamente
estável, com via aérea
patente e dor localizada na área
esternoclavicular direita.
Ao exame clínico apresentava
postura de pronação da escápula
direita e hematoma na região
esternoclavicular direita, com óbvia
deformidade local (Figura 2). A
função motora e a sensibilidade dos
nervos mediano, cubital, musculocutâneo,
radial e axilar estava
intacta, apresentando o pulso radial
simétrico. Não tinha dispneia ou
dificuldade da deglutição.
As radiografias convencionais não
mostravam lesão óbvia, mas a TAC
(Figura 3) confirmou luxação posterior
da articulação esternoclavicular,
com compressão do mediastino
superior.
Devido à proximidade com estruturas
mediastínicas e à possibilidade
da existência de complicações graves
associadas, estas luxações devem ser
reduzidas o mais precocemente possível.
A manobra usada consistiu na
abdução/tração: doente em decúbito
dorsal com uma almofada entre os
ombros, tração gradual aplicada no
membro abduzido, com progressão
lenta para a extensão (Figura 4). 3,8
Uma vez que a manobra de redução
fechada não foi
bem sucedida,
o doente foi
intervencionado
cirurgicamente. A
articulação esternoclavicular
foi
isolada e reduzida
por via aberta. A
articulação apresentava-se
com
tendência a reluxar
para posterior,
tendo sido fixada
Revista de Medicina Desportiva informa julho 2020· 7