Revista de Medicina Desportiva Janeiro 2022 | Page 27

perturbação de pânico ainda não tenha sido estudado em atletas . 11 Quando presente , deve-se tratar a patologia de base e desencorajar o evitamento fóbico da atividade física . 6 A perturbação obsessivo- -compulsiva distingue-se dos rituais competitivos dos atletas quando se estende além do ambiente desportivo , ocupa uma porção importante do dia e se associa a elevados níveis de ansiedade de não forem realizados . 6 Os atletas podem também sofrer de perturbação de stresse pós-traumático ( PTSD ) consequentes de traumas comuns à população geral , mas também lesões catastróficas , perdas de autoestima e de reconhecimento social . 12 Quando presente , a PTSD pode interferir com a reabilitação e regresso à atividade desportiva . 6 A psicoterapia cognitivo- -comportamental é , isoladamente ou em associação , o tratamento de primeira linha das perturbações de ansiedade . O escitalopram e a sertralina são os fármacos mais utilizados pelos psiquiatras desportivos . 13 As benzodiazepinas e os betabloqueadores são evitados .
Perturbação afetiva bipolar ( PAB ) e perturbações psicóticas Não está ainda estudada a prevalência destas patologias em atletas . Porém estas iniciam-se geralmente no período de maior capacidade desportiva dos atletas 14 e estão associadas a maior disfuncionalidade , pelo que atletas com sintomatologia afetiva ou psicótica devem ser avaliados por um psiquiatra . 15 No entanto , não são incompatíveis com o sucesso desportivo . 16 Ainda não existem recomendações psicofarmacológicas especificas nesta população , todavia deve-se considerar o rendimento desportivo na decisão terapêutica . Assim , em atletas , a lamotrigina e o lítio são preferidos na PAB e o aripiprazol nas perturbações psicóticas . 13
Perturbação de hiperatividade e défice de atenção ( PHDA ) A PHDA é uma perturbação do neurodesenvolvimento que causa disfunção em várias áreas da vivência do doente e perturba as suas relações interpessoais . A sua prevalência em atletas é superior à população geral 17 , pois as crianças com PHDA têm maior tendência a fazer desporto pelo reforço positivo e efeitos ativadores do exercício físico . Porém , os sintomas de PHDA podem prejudicar o desempenho desportivo . Os atletas com PHDA têm maior probabilidade de sofrerem de concussões cerebrais e apresentam maior tempo de recuperação . 18 Quanto ao tratamento , as intervenções psicossociais são importantes nos sintomas ligeiros e na gestão da disfuncionalidade associada à PHDA . A atomoxetina é o fármaco de escolha em atletas . 13 Os estimulantes são a primeira linha de tratamento na população geral , mas associam-se a risco de utilização como substância ergogénica , estando por isso incluídos na lista de substâncias proibidas pela agência mundial de antidopagem .
Perturbações do comportamento alimentar e do sono As perturbações do comportamento alimentar ( PCA ) associam-se a diminuição do rendimento e , nos casos mais graves , a complicações médicas que podem levar à morte , sendo a anorexia nervosa a que apresenta pior prognóstico . São mais prevalentes nos atletas , comparativamente à população geral , no género feminino 19 e em desportos que têm classes por pesos ou com componente estética . Nestes , a prevalência de PCAs pode atingir os 25 %. 20 Por este motivo , é recomendado o rasteio sistematizado de sintomas de nos atletas . O tratamento é difícil e deve envolver uma equipa multidisciplinar . A psicoterapia cognitivo- -comportamental é o tratamento de escolha , porém pouco estudado em atletas . A psicofarmacologia é utilizada maioritariamente para o tratamento de comorbilidades . 21 O retorno à atividade desportiva é também um momento essencial da gestão de um atleta com PCA .
Os atletas dormem menos horas e com pior qualidade de sono . 22 Os períodos antes de competição , o jet lag e a maior utilização de dispositivos eletrónicos aumentam o risco de perturbações do sono , condicionando o desempenho desportivo do atleta . 23 Os psiquiatras desportivos medicam preferencialmente com melatonina e trazodona em baixa dose e evitam a utilização de benzodiazepinas . 13
Perturbações aditivas e adição ao desporto Os atletas utilizam substâncias com potencial aditivo com menor frequência que a população em geral , especialmente em períodos de competição . 24 No entanto , os atletas participam em episódios de binge drinking com elevada frequência . 25 A nicotina , fumada ou vaporizada , é ainda utilizada com frequência por atletas . 26 A substância ilícita mais utilizada por atletas é a cannabis 27 , seguida pela cocaína . Os estudos efetuados sobre esteroides anabolizantes baseiam-se em autorrelatos , pela que a baixa prevalência encontrada é questionável . A Agência Mundial Antidopagem reporta 1-2 % de testes positivos para substâncias ergogénicas , sendo que 48 % destas são esteroides anabolizantes . 28 Por outro lado , as perturbações aditivas relacionadas com o jogo são mais prevalentes em atletas . 29 Estas são normalmente adições escondidas , mas as suas consequências a nível desportivo e biopsicossocial são igualmente severas . 29 As perturbações aditivas moderadas a graves são relativamente pouco frequentes em atletas no ativo e mais comuns em atletas retirados . 24 A prevenção é essencial na abordagem a perturbações aditivas . Podem ser utilizados métodos como testagem ( p . ex . passaporte biológico ), rastreios , intervenções psicoeducativas e psicoterapêuticas ( individual ou em grupo ). A adição ao desporto é comportamental e ainda não está especificada nos manuais de diagnóstico de psiquiatria . A sua evolução assemelha-se a outras perturbações aditivas , pela evolução natural e psicopatologia partilhada , assim como risco acrescido de outras adições e co-morbilidades psiquiátricas . 30 Mesmo cumprindo alguns critérios de diagnóstico , um atleta de alta competição não sofre necessariamente de adição ao desporto . A prevalência é estimada em 3 % na população geral , mas pode ser ainda mais elevada em grupos específicos como os ultramaratonistas . 31
Concussão cerebral relacionada com o desporto As concussões cerebrais relacionadas com o desporto ( CRD ) são comuns . Estas representam os
Revista de Medicina Desportiva informa janeiro 2022 · 25