Revista de Medicina Desportiva Janeiro 2021 | Page 13

No pré-operatório importa ainda ensinar a marcha com canadianas , o trabalho estático precoce , particularmente do aparelho extensor do joelho , a mobilização da patela e a importância do trabalho do membro contralateral do tronco e dos membros superiores . Informar o doente sobre a complexidade e exigência do programa de reabilitação aumenta a sua motivação e disponibilidade para um cumprimento rigoroso dos objetivos estabelecidos .
Condicionamento ao esforço
A capacidade aeróbia está reduzida de forma significativa nos atletas com lesão do LCA 39 , comparativamente aos atletas de mesmo nível competitivo não lesionados .
Desconhece-se se esta condição decorre exclusivamente da inatividade pós-lesional ou se é já um fator de risco predisponente para a lesão traumática do LCA . 40
Um programa de reabilitação de seis meses não foi suficiente para que futebolistas de elite regressassem aos níveis aeróbios pré- -lesionais 39 , facto que condiciona de forma significativa a sua funcionalidade e agrava o risco lesional . Existe reduzida evidência relativa às necessidades fisiológicas para uma retoma segura da exigência competitiva . 41
No futebolista de elite foi sugerido a necessidade de um VO 2
max de 60 ml / kg / min como condição para uma prestação competitiva eficaz 39 , 40 , bem como um limiar anaeróbio adequado à exigência da competitiva da modalidade . 42 Os deficites de VO 2
max e a não recuperação do limiar anaeróbio podem justificar a discrepância entre os elevados scores funcionais do joelho e a reduzida performance competitiva do atleta
41 , 43
na sua modalidade .
Os índices de fadiga devem também ser considerados no âmbito da proteção da plastia . A fadiga neuromuscular agrava diversos riscos biomecânicos 44 , promovendo a diminuição da força máxima de uma cadeia muscular e a deterioração da organização do movimento nomeadamente da proprioceção . 44-46 Existe ainda evidência que a fadiga pode induzir deterioração da atividade muscular voluntária nos músculos
44 , 47
do membro não afetado .
A fadiga afeta a qualidade do movimento mais no joelho com plastia ligamentar que no segmento não operado . 48 Muitos dos critérios funcionais e neuromotores aplicados na retoma desportiva utilizam testes quantitativos ( Hop Test ) e qualitativos ( Landing Error Scoring System ) que devem ser aplicados em ambiente de fadiga , recriando a exigência competitiva e comparando com o atleta não traumatizados . 49 Os testes qualitativos são mais sensíveis ao ambiente de fadiga , sendo desta forma mais eficazes enquanto elementos de prognóstico .
A condição psicológica e cinesiofobia
A avaliação das caraterísticas psicológicas assume uma importância crescente no âmbito da patologia traumática do LCA . Fatores como a autoeficácia , a gestão das expetativas e o medo da recidiva lesional têm influência no evoluir do programa de reabilitação e na performance desportiva .
38 , 50
A reconstrução ligamentar apresenta habitualmente índices funcionais elevados em contraste com menos de 50 % dos atletas a retomarem o nível desportivo pré-lesional . A disponibilidade psicológica para retomar o desporto , sem receios e com motivação competitiva é cada vez mais identificado como um fator decisivo no prognóstico . 11 , 51 No pré-operatório a perceção relativa à eficácia da funcionalidade do joelho lesado é preditiva do padrão sintomático e da atividade muscular 12 meses após a reconstrução ligamentar . 52 O receio da recidiva lesional é sugerido como a razão mais referida para justificar a redução ou cessação da participação desportiva
10 , 11
Em contextos pouco sintomáticos , o receio de ter dor pode influenciar a função articular 53 e menos motivação para o retorno desportivo está associada em estudos cinemáticos a assimetrias no padrão de marcha . 54 A relação entre a elevada autoeficácia e a baixa catastrofização da dor , medida na 4 ª semana após ligamentoplastia , está associada a maior disponibilidade para aceitar a exigência da reabilitação às 12 semanas . 55 A progressão do score psicométrico ACL-RSI 56 está fortemente relacionada com as características da retoma desportiva . Os valores mais elevados deste score verificam- -se nos atletas que retomam o nível pré-lesional . 57 Neste estudo o score ACL-RSI de referência para retoma desportiva aos dois anos deve ser superior a 65 pontos .
A cinesiofobia , também referida como o medo ao movimento , foi definida como um estado de comportamento excessivo e não racional que promove a perceção de risco de dor ou de recidiva lesional para uma dada atividade . 58 , 59 Esta condição patológica envolve fatores neurobiológicos e psicológicos relacionados com a dor e tem diversas implicações clínicas , nomeadamente a alteração do programa de reabilitação . Mais receio de fazer movimento determina maior perceção de dor durante o programa de reabilitação funcional , condicionando assim o trabalho de força e de proprioceção . A cinesiofobia é identificada como uma causa de frustração tanto para o profissional da saúde como para o atleta , podendo deteriorar a sua relação , bem como a motivação para a intervenção cinesiológica .
Assim , os sintomas e sinais da cinesiofobia devem ser detetados precocemente , se possível na primeira consulta . De referir que um score elevado de dor pré-operatória está negativamente associado ao surgimento de cinesiofobia durante
55 , 57 a reabilitação . Um estudo refere que após a reconstrução ligamentar do LCA , 82 % dos atletas retomam alguma forma de participação no desporto , 63 % retomam ao nível pré-lesional e 44 % retomam a competição . 10 , 11 O medo da recidiva é referido como uma das principais razões que justificativa da redução ou do abandono competitivo .
Os estudos de evidência sugerem que todas as guidelines para identificação de critérios para uma retoma segura do desporto devam considerar a associação das deficiências do joelho , a função neuromotora com a componente psicológica , cognitivo- -comportamental. 60
Revista de Medicina Desportiva informa janeiro 2021 · 11