Revista de Medicina Desportiva Informa Setembro 2019 | Page 8
Rev. Medicina Desportiva informa, 2019; 10(5):6-8
https://doi.org/10.23911/FMUP_2019_9
O que andamos a ler
Nesta rúbrica pretendemos dar notícia de
artigos recentes ou que merecem ser (re)lidos e
comentados. É uma página aberta a todos.
Sleep and Athletic Performance 1
Dr. Igor Santos Neto
Médico, interno de formação
especifica de Anestesiologia,
Centro Hospitalar do São João,
Porto, Pós graduado em Medicina
Desportiva.
Resumo e comentário
O Dr. Andrew Watson, médico, da
Universidade de Wisconsin (EUA),
publicou um texto muito interes-
sante sobre o sono e a sua importân-
cia no rendimento atlético, tendo
consultado mais de 50 publicações
científicas. O conteúdo é de grande
importância para o atleta, pois o
sono tem relação com a saúde e com
o bem-estar, assim como com o
desenvolvimento físico, emocional,
cognitivo e na qualidade de vida. De
acordo com a Academia Americana
da Medicina do Sono, os adultos
devem ter entre 7 a 9 horas de sono
para melhorar o rendimento e o
estado de saúde, ao passo que os
atletas poderão necessitar de mais
horas de sono, entre 9 e 10 horas,
para melhorar recuperação e a
adaptação ao esforço físico. Todavia,
o estudo realizado em mais de 800
atletas de elite sul-africanos revelou
alguma preocupação. Neste estudo,
quase 75% dos atletas referiram
dormir menos de 8 h/dia e 11%
dormiam menos de 6 h/dia. Em
momentos pré-competitivos, o
padrão do sono pode piorar, pois a
maioria dos 103 atletas referiram
dormir menos de 8 horas e com pior
qualidade do sono. O autor refere
que não existem ainda diretrizes
específicas em relação à duração e
qualidade do sono dos atletas, mas
6 setembro 2019 www.revdesportiva.pt
estes parecem ter melhor qualidade
e duração do sono que os colegas
sedentários. Por outro lado, o exercí-
cio físico de intensidade moderada
tem sido recomendado para a
melhoria da qualidade do sono.
Os atletas têm grande dificuldade
de auto-avaliação referente à neces-
sidade, duração, qualidade sono, o
que dificulta a busca de orientações
sobre o sono nos vários momentos
da sua vida desportiva. O treino e a
consequente fadiga têm influência
no sono. O estudo realizado em tri-
-atletas com overreaching funcional
encontrou perturbações do sono e
maior incidência de infeções respi-
ratórias superiores, assim como o
aumento da carga de treino causou
alterações do sono em mulheres
jogadoras de futebol. O horário dos
treinos e dos jogos também é impor-
tante. Nos dias em que os treinos
foram marcados para muito cedo
na manhã verificou-se que nos 70
atletas de vários desportos houve
redução da duração do tempo de
sono e aumento do nível de fadiga
pré-treino, tendo os autores sugerido
a implementação de sestas compen-
satórias. Os jogadores do Australian
Rules Football quando jogavam à
noite adormeceram mais tarde, o
tempo na cama foi mais curto e o
sono total obtido foi menor, compa-
rativamente quando os jogos foram
realizados durante o dia.
Existem muitos fatores que podem
perturbar o sono. Desde logo a
competição, pois para além do
aumento da carga fisiológica rela-
cionada com o exercício, há outras
circunstâncias ligadas ao jogo, como
sejam as viagens longas e os aspe-
tos psicológicos (ansiedade, stress,
alteração do estado de humor).
Estes são elementos perturbadores
da qualidade e da duração do sono.
Uma revisão sistemática publicada
em 2017 concluiu que existe pre-
valência elevada de sintomas de
insónia: tempos de latência do sono
maiores, maior fragmentação do
sono, sono não reparador e fadiga
excessiva durante o dia. Dos 652
atletas alemães, dos dois sexos, 66%
teve problemas de sono na véspera
da competição pelo menos uma vez
no ano anterior, assim como em
atletas de elite australianos, nos
quais 59% dos atletas de equipa não
tinham estratégias para lidar com
o problema. Uma curiosidade neste
estudo tem a ver com o facto dos
problemas com o sono, com a idade,
diminuírem nos atletas dos desportos
coletivos e aumentarem nos atletas
dos desportos individuais.
As viagens longas perturbam os
horários do sono e dissociam os rit-
mos circadianos, com consequências
no rendimento desportivo. O autor
refere que para além da ansiedade
e do stress associados à viagem, o
jet leg decorrente de viagens através
de vários meridianos causa fadiga,
desorientação e alteração do sono
com consequências inevitáveis no
rendimento. Treinar e competir fora
dos horários habituais, fora dos rit-
mos circadianos de treino e de jogo
realizados “em casa”, tem sido asso-
ciado a diminuição do rendimento e
ao ganhar e perder jogos.
Uma discussão interessante no
texto tem a ver com o atleta-estu-
dante, que associa o stress do estudo
e dos exames e tem necessidade de
sacrificar tempo de sono para estu-
dar e treinar, sendo o problema mais
grave nos atletas mais jovens. Agora,
o rendimento escolar pode perigar, o
que aumentará a ansiedade e stress
no atleta-estudante e piorará a dura-
ção e qualidade do sono.
O autor aborda ainda a relação
entre sono e o rendimento des-
portivo, começando por referir que
estudos prévios relacionaram o
sucesso na competição com a quali-
dade e duração do sono. Por exem-
plo, 576 atletas brasileiros foram
questionados sobre a qualidade do
sono antes e durante a competição
e a maioria referiu ter qualidade
normal ou boa, mas a má qualidade
do sono foi considerada um fator
independente de mau rendimento