Revista de Medicina Desportiva Informa Setembro 2012 | Page 24
registando-se o intervalo máximo.
As ondas U de grande dimensão
que estão fundidas com a onda T
devem ser incluídas na medição
(Fig. 1, centro). As ondas U de menor
dimensão e que estão bem individualizadas devem ser excluídas (Fig.
1, á direita). A este respeito, Viskin
concluiu, num artigo com o título
Inaccurate electrocardiographic interpretation of long QT, que a maioria dos
médicos, incluindo muitos cardiologistas, não consegue calcular com
precisão o valor do QTc e, como tal,
podem não identificar corretamente
um QT longo5.
É fundamental validar manualmente os valores calculados automaticamente pelo eletrocardiógrafo
computadorizado e efetuar medições corretas nas situações em que o
fim da onda T é pouco definido. Nestes casos deve identificar-se o fim da
T através da interceção da tangente
da onda T com a linha isoelétrica
ou então eliminando a cauda da T
(figura 1).
Os efeitos do treino intenso e
prolongado
Os atletas de alta competição são
um grupo único de indivíduos com
massa ventricular esquerda frequentemente aumentada e valores
de frequência cardíaca de repouso
por vezes inferiores a 60 bpm. A
bradicardia e, consequentemente, o
aumento do intervalo R-R, prolonga
o intervalo QT em valor absoluto.
O aumento da massa ventricular
esquerda origina o atraso fisiológico
da repolarização ventricular e também prolonga o intervalo QT.
A presença de uma arritmia
sinusal muito marcada, frequente
em atletas, é um bom exemplo das
dificuldades deste tipo de cálculo
neste grupo de indivíduos. Embora
o valor absoluto do intervalo QT
possa estar sempre prolongado, a
escolha do valor do intervalo QT
que se segue ao intervalo R-R mais
curto tenderá a encontrar um valor
de QTc mais prolongado (hipocorreção) e, pelo contrário, a escolha
do valor que se segue ao R-R mais
longo ocasionará um valor de QTc
mais curto, podendo esta diferença
ser muito significativa em termos da
interpretação final dos resultados.
Em geral utiliza-se o intervalo R-R
médio. A presença de alterações da
repolarização ventricular com ondas
T/U proeminentes pode também
dificultar a medição do intervalo QT
(ver Fig. 1).
Classificação
Conhecem-se duas formas de SQT: a
forma congênita e a forma adquirida.
Dois fenótipos clínicos foram descritos, na forma congénita:
·a
forma autossómica dominante,
mais comum, denominada síndroma de Romano-Ward, tem um
fenótipo puramente cardíaco;
·a
forma autossómica recessiva,
mais rara, síndroma de Jervell e
Lange-Nielsen, está associada a
surdez neuro-sensorial.
Na forma adquirida o prolongamento do QT foi induzido pelo uso
de diferentes drogas (quinidina,
procainamida, amiodarona, fenotiazinas, antidepressivos tricíclicos
e outras), ou então por distúrbios
metabólicos (hipocalemia, hipomagnesemia), distúrbios nutricionais
(anorexia, dieta líquida) ou lesões
do sistema nervoso central, entre
outras causas. A longa lista de medicamentos e outros fatores capazes
de prolongar o intervalo QTc pode
Fig. 1. – O intervalo QT é definido a partir do início do complexo QRS até ao fim da
onda T. O método das tangentes define o fim da onda T como a interceção entre a
linha de isoelétrica com a tangente traçada através do máximo declive da onda T.
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ser consultada no website: http://
www.azcert.org/medical-pros/drug-lists/drug-lists.cfm.
Este efeito secundário deve ser
tomado em conta, pois acredita-se
que em determinados indivíduos
poderá existir uma suscetibilidade
individual aumentada para induzir
torsades de pointes quando sujeitos a
determinados medicamentos (anti-histaminicos, macrólidos…).
Sabemos que podem existir
portadores da SQTL com QT normal (SQTL oculto), assim como
elevado número de indivíduos com
QT anormalmente prolongado sem
doença cardíaca, factos que dificultam simultaneamente o diagnóstico
desta síndroma e a sua exclusão.
São três os fatores principais que
podem contribuir para o aparecimento da síncope ou da morte
súbita: o exercício físico (LQT1),
especialmente a natação, as emoções ou stress emocional (LQT2),
como por exemplo, um ruído intenso
(despertador) ou um susto, e na
variante LQT3 o sono ou o repouso.
O diagnóstico
O diagnóstico da síndroma do QT
longo não pode assentar exclusivamente na identificação do valor
anormalmente aumentado do intervalo QT e deve basear-se na tríada
clássica:
. intervalo QTc prolongado,
. síncope inexplicada ou taquicardia ventricular polimorfa,
. história familiar de morte súbita
ou da SQTL.
Com base nestes critérios, a prevalência da SQTL tem sido referida entre 1:2.500 e 1:10.000, o que
contrasta com a maior prevalência
do QTc prolongado referida para
a população de atletas de 0.4% a
0.69%. A comparação destas taxas
sugere que a maioria das mutações SQTL poderiam ser benignas
ou, então, que a maioria dos atletas com QTc prolongado não têm
esta doença. Vimos ainda que um
intervalo QT prolongado num atleta
pode resultar do efeito do atraso da
repolarização em consequência do
aumento fisiológico da massa v